segunda-feira, 17 de outubro de 2011

  • PEDRO PIRES E AS RAZÕES DA FUNDAÇÃO MO IBRAHIM

A Fundação Mo Ibrahim distinguiu Pedro Pires. O homem, de repente, está coberto de ouro. A quantia é considerável, para os tempos que correm; e se souber fazer bom uso dela – como deverá, em razão da natureza do prémio – a comunidade sairá a ganhar. Agora, as premissas da Fundação Mo Ibrahim para atribuir o prémio de 5 milhões de $USD anuais, durante dez anos (acrescidos, decorridos os 10 anos, de 200.000 $USD anuais e vitalício), ao ex-Presidente Pedro Pires são falaciosas; e, na minha opinião, não são aplicáveis a Pedro Verona Pires. Este, lembro: (i) foi Primeiro Ministro de um sistema político ditatorial e violador dos Direitos humanos dos Cabo-verdianos, (ii) chegou à Presidência da República com «leite derramado», (iii) foi um Presidente da República ausente ao nível social e institucional e, a final do segundo mandato, (iv) aceitou um escandaloso prolongamento do seu mandato (a) a revelia da Constituição, das normas fundacionais do Estado de Direito democrático em Cabo Verde, (b) não exercendo as funções de guardião político da Constituição, (c) desconsiderando a soberania popular que o elegeu a não dar nenhuma satisfação ao povo de Cabo Verde quando o seu poder foi usurpado nas suas barbas.

Neste quadro, e até sendo bondoso, não poderia, em boa justiça, ser depositário de um prémio que deveria, em princípio, celebrar a excelência no exercício do poder político e o respeito pelos valores da boa governação; e, salvo melhor opinião e que me prove o contrário, não existe nem boa governação nem bons governantes quando não se respeita a Constituição e os Direitos humanos dos cidadãos. Fica a ideia, pelas palavras de Ahmed Salim Salim, que o premiado era José Maria Neves e não Pedro Verona Pires...

Até parece que a Fundação Mo Ibrahim não conhece nem a história política de Cabo Verde nem o sistema político cabo-verdiano. Mas conhece, e tem o dever de conhecer.

Mas, então, porque este prémio, agora? – perguntar-me-á. Bastará conhecer a Fundação – v.g., verificar o ethos da sua retórica –, e não nos admiraremos em nada com este prémio; agora e neste momento. Prémio que, na verdade, é uma doação para o PAICV prosseguir a promoção dos fins e dos objectivos que estiveram na criação do PAIGC e toda a troupe pan-africanista. (Terá o leitor seguido, v.g., os discursos da última Assembleia da ONU, e cotejado isso com as últimas intervenções públicas de Pedro pires cidadão?) Alguém tem dúvidas? Que os tire, pois a informação está disponível, basta saber lê-la, escutá-la, e interpretá-la devidamente. Não me vou alongar em teorias, basta(rá) ver as declarações de Pedro Pires, logo depois da tomada de posse de Jorge Carlos Fonseca como Presidente da República, e compará-las com os do dia que ficou a saber oficialmente que o prémio lhe foi atribuído.

No plano estrito da promoção do pensamento, nada de particular a dizer sobre os fins; desde que seja no quadro das instituições democráticas e dos valores da Constituição. O dinheiro existe para fazer as pessoas felizes; para tornar este Mundo melhor do que o encontramos. Para pouco mais serve... E quem o tem em quantidade suficiente, como a Fundação Mo Ibrahim, a ponto de escolher um homem e transformá-lo num dos cidadãos mais ricos da sua nação, pode fazer mais… pois tem o dever de fazer. Mas este é, de todo, um outro prisma com que se deve olhar a Fundação Mo Ibrahim e a sua relação com Cabo Verde e os demais Estado africanos que vem escrutinando nos últimos anos. O que interessa, agora, é a razão e fundamentos deste prémio.

O que a Fundação Mo Ibrahim faz, com este prémio, foi/é realizar o sonho pan-africanista do socialismo independentista de déspotas esclarecidos que, pelo menos no plano histórico, Aristides Pereira e Pedro Pires são a referência em Cabo Verde: estar no poder para sempre, segundo um dado prisma de ver e estar no poder. Pedro Pires perde o poder político directo e passa a deter o económico, um considerável poder económico no contexto cabo-verdiano; e, estrategicamente aplicado e potenciado, poderá afectar o equilíbrio social em determinadas áreas da sociedade cabo-verdiana. A democracia tem destas coisas; pois a matriz da nossa Constituição, ex natura, não prevê de forma expressa todos os cenários. Por isso, como dizia bem no outro dia o Presidente da República – Jorge Carlos Fonseca, todos devemos ser guardiões da Constituição; mais digo: devemos estar alertas e vigilantes, e não deixar o silêncio vencer as nossas razões.

Este prémio é, do meu ponto de vista, uma forma mediata e subliminar de ingerência política na vida dos países africanos por parte da Fundação Mo Ibrahim que, em verdade, promove um determinado ideário histórico e político que briga com a autonomia e a autodeterminação histórica dos Estados. «Temos de nos preocupar com o futuro», diz o laureado com um prémio que, é, no plano pecuniário, de longe, muitíssimo superior ao Prémio Nobel mas não visa, objectiva e subjectivamente, premiar o mérito mas dar condições a quem, na perspectiva da Fundação, tem condições para conseguir os seus objectivos.

O prémio tem, até na estrutura, uma dimensão de ingerência e de intervenção social e política mediata. E nisso, de nos preocuparmos com o futuro do país, concordo com o ex-Presidente Pedro Pires que, ao que parece – pelas suas declarações, e que não é novidade de todo –, coloca os camaradas e a história do PAICV em primeiro lugar, acima de qualquer outra preocupação social, qualquer outro problema que aflija ou possa afligir os cabo-verdianos em geral. Foi a primeira reacção… e, se perguntarem a o estudioso da Psicologia este dir-lhe-á, prezado leitor, que o que importa não é como agimos, mas como reagimos. Este, o reagir, mostra o que somos e pensamos na verdade, mostra o nosso verdadeiro «eu» o nosso «inner man», dizem os anglo-saxónicos. (recordo ao leitor que, poucos meses atrás, perguntavam a Pedro Pires o que pensava sobre um dado problema social; e respondeu que «não tinha pensado sobre isso». E se «não pensava» nos problemas sociais como Presidente da República… como irá pensar neles como homem rico?)

Mas este prémio fica-lhe bem, pois é um prémio dos seus pares pan-africanistas. Espero que não seja uma tentativa de usar o manto dos dólares, dos milhões… para nos impor um Presidente paralelo, de cidadania musculada pela força do dinheiro, parar disseminar a Agenda política pan-africanista.

Mas este prémio fica bem a Pedro Pires por duas razões: (i) Pedro Pires não roubou o povo Cabo-verdiano para enriquecer depressa e bem; (ii) Pedro Pires, mau grado ter sido o Primeiro Ministro do regime ditatorial, foi, no plano económico e social, um bom Primeiro Ministro gestor em face das circunstâncias (o que venho dizendo nos últimos sete anos em escritos aqui no Liberal, e pelos vistos, a Fundação Mo Ibrahim cauciona com este prémio; por tê-lo concedido ao ex-Presidente e ex-Primeiro Ministro, mas é este que tem, no nosso sistema político, funções governativas para a sua «boa governação» ser avaliada e não aquele). Este prémio, como se pode ver… briga com o conceito de «boa governação», mas admito a sua bondade (sendo sofrível numa instituição que promove a ciência, a investigação e a excelência) se o critério tiver sido o do pragmatismo e se se considerar um conceito ad hoc de boa governação dissociada do respeito pelos Direitos humanos que, no Consulado do Executivo de Pedro Pires (1975/1991) não existia.

Fica, no entanto, a ideia – no rigor dos conceitos e das situações históricas – de que a Fundação Mo Ibrahim entende que pode haver «boa governação», excelência desta até!, num quadro político das democracias semânticas e autoritárias que fizeram história no pós independência (do «socialismo africano» ao Nkrumahnismo, passando pela ditadura pragmática cabo-verdiana) e que muitos, ainda hoje, vêm virtualidades. Posso olhar e entender as situações com bondade, mas não cauciono este tipo de pensamento, pensamento que, também ele, briga com a ética democrática do Estado de Direito democrático.

Mas esta é uma questão que extravasa esta nota, e não vou da sua paciência, ó prezado leitor. O que Pedro Pires vai fazer com o dinheiro? A ver vamos, a final; mas parece ter um destino preciso, ainda antes de publicamente conhecido. Espero que não venha ter a natureza de fundo fiduciário político do novo pan-africanismo. A democracia – e a liberdade que transporta, dizia, também tem destas coisas; também tem os seus perigos endémicos. O «Governo pelo consenso» propugnado por José Maria Neves, e importado do pensamento de Giovanni Sartori, é um deles. Escapamos dele com as eleições presidenciais, e, agora, vejo uma armadilha silenciosa a rodear o Presidente da República – Jorge Carlos Fonseca e o MPD.

Ao se falar, reiteradamente, em «coabitação política – o que é uma falácia – tenta-se virar o feitiço contra o feiticeiro. Esta lógica, que não é verdadeira nem representa a verdade, pode vir a ter custos consideráveis no futuro; para o MPD e para o Presidente da República que poderá ver a sua acção política, que se quer e se deseja de vigia efectivo do poder político no quadro constitucional, sob suspeição sempre que a sua acção não seja de cooperação cega (como foi a de Pedro Pires na Presidência) com o Executivo.

O Presidente Jorge Carlos Fonseca (o único Presidente… pois isso de chamar «Presidente» a ex-Presidentes é um americanismo bacoco contra a lógica do nosso sistema político e a Democracia: findo o mandato o cidadão volta à condição de simples cidadão da República, não mais se identificando com a Instituição e desprovido dos galões do Órgão de Soberania Presidente da República que só o povo, nas urnas e por sufrágio universal, directo e com mandato temporalmente definido, pode conferir) é um Presidente emergente da sociedade civil, e que teve um justo e merecido apoio político do MPD e dos seus militantes, sem questionamento ou cisões. Mas não é, como seria se fosse eleito, Manuel Inocêncio Sousa. O actual Presidente da República não é um Presidente do MPD ou um Presidente da Oposição ao PAICV. Não é um Presidente da República com poderes executivos poderes executivos e/ou militante de um partido político (como seria, v.g., Aristides Lima se fosse eleito e representasse a facção Pirista na Presidência da República – aí, sim, teríamos coabitação de tendências do PAICV…).

Neste ciclo político que agora se inicia não podemos ter um Presidente rico e um Presidente pobre; um no Plateau e o outro rodeado dos milhões da Fundação Mo Ibrahim; até porque a Constituição, e soberania do povo, só admitem um Presidente Da e Na República. Veremos onde irá Pedro Pires com 5 milhões de dólares por cada ano que Jorge Carlos Fonseca irá, previsivelmente, passar no palácio presidencial. É que os homens (com excepção daqueles que curam mais das coisas do espírito que das riquezas), quando repentinamente ricos, perdem uma qualidade, quando o têm: a humildade e o senso de realidade. O dinheiro afecta a maioria das pessoas. As excepções, reitero, são as pessoas como um amigo que, há poucos meses, perdeu 22,5 milhões de dólares num ápice. Agiu e age como se fossem 22,5 dólares.

A Fundação Mo Ibhraim e a todos nós, é bom lembrar o que dizia o profeta: Vae qui dicitis malum bonum, et bonum malum (Isaías, V.20). Sim, «ai de vós os que chamais mal ao bem e bem ao mal!». Mas isto, isto é pregar no deserto?

PS: A ideia proposta a Pedro Pires, de criar uma Fundação, é… de rato: evita a tributação, e, assim, ajudará as prósperas finanças nacionais. E esta, hem? Belos amigos de Cabo Verde!

1 comentário:

Ariane Morais-abreu disse...

C'est de la rigolade ce prix, comme est une rigolade cette fondation !! Vraiment, nous les nègres nous avons toujours la manie d'imiter le pire pour précisément casser du nègre. De quel droit cette mascarade de prix à propos d'une gouvernance qui est tout sauf démocratique et bonne pour le peuple cv!! Ces vieux singes se congratulent entre eux car ils savent qu'ils ne sont pas crédibles, que ce sont des escrocs et surtout des assassins... D'ailleurs d'où vient cet argent de M. Mo ??!! Et pourquoi le donner à quelqu'un qui n'en a pas besoin pour vivre!! Que manigancent ces gens contre nous, les peuples?!! Pires et sa tribu ont volé le peuple cv sans vergogne et sans relâche depuis 1975!! Renato Cardoso a été sacrifié sur l'autel de leurs orgies car il avait mis le doigt sur la faille. Certains voudraient nous faire croire que ces gens-là sont probes et honnêtes, qu'ils n'ont aucun compte caché à l'étranger et qu'ils n'ont pensé qu'au bien être des Cv!! LOL, mdr...Que cherchent-ils avec ce prix du mensonge et de la honte ? PP pense-t-il pouvoir imposer aux Cv sa version de notre histoire, sa dynastie de cloportes, ses tares et vices cachés?!! Finalement un prix est décerné à notre PP pour ses bons et loyaux services rendus, par exemple, à une Afrique du Sud de l'apartheid, à une médiation fantoche en Côte d'Ivoire, et pour résumé à ceux qui assassinent l'Afrique...

A toutes fins utiles, je pense que tu devrais adresser ce texte à la fondation et principalement à son fondateur pour qu'ils sachent qui est PP et tout le mal qu'il a fait au Cap Vert. Je parle très sérieusement!! D'ailleurs, nous devrions...