quarta-feira, 23 de novembro de 2011

  • THE RUMBLE IN THE ASSEMBLEIA NACIONAL OU ELOGIO DA LOUCURA
Muitos são os que comentaram a suspensão dos trabalhos da Assembleia Nacional; não por causa do Orçamento Geral do Estado de 2012 mas por causa da quase The Rumble in the JungleI mean: Luta n’Assembleia Nacional – cabo-verdiana. Muitos se mostram incomodados, outros escandalizados porque «aconteceu uma cena inédita» com a suspensão dos trabalhos na Assembleia Nacional».

Mas, ó povo! não é inédito, e nem me surpreende – infelizmente – este tipo de comportamento dos deputados. Um elogio: Aristides Lima – posso fazer este juízo hoje, passado o calor eleitoral – tendo muitas vezes mostrado parcialidade nos seus juízos enquanto Presidente da Assembleia Nacional, sempre conseguiu uma coisa: mantinha os deputados em ordem! Com ele não havia recreio; e, parece, que era e é mérito que se lhe deve reconhecer. – «Porquê?» – perguntar-me-á. Pela simples razão que este episódio não é inédito; é o segundo… no espaço de meses.

Lembro, a título de exemplo, o que aconteceu há poucos meses: um deputado do PAICV, por sinal hoje Ministro dos Assuntos Parlamentares, quase que mostrava os seus dotes Alianos, na Assembleia Nacional, contra com um outro deputado Foremaniano, i.e, do MPD. E o deputado Aliano é, hoje, Ministro dos Assuntos Parlamentares poucos meses depois de uma quase (quase porque a intervenção de outros deputados foi providencial) cena de pugilato na Assembleia Nacional…

Assim, é difícil manter ordem na casa da coisa pública.

As palavras de Orlando Dias e de José Manuel Andrade são graves, mas não tão graves como o que aconteceu antes; não. (A violência verbal quase que se tornou física...) É certo que dizer que o Primeiro Ministro troca de mulher como quem troca de camisa é ofensivo – «difamação» em sentido técnico jurídico, e previsto e punido pelo Código Pena Cabo-verdiano – e indignificante para ambos. (Os deputados Orlando Dias e José Manuel Andrade estão a precisar de aulas de retórica – ou de ler m dicionário de A a Z, urgentemente). Mas, dizia… a acusação de womenizer ao Primeiro Ministro é indignificante para ambos, pela forma e pelo conteúdo.

(i) Para o deputado que acusa o cidadão que está Primeiro Ministro de adúltero – ele que é recém casado e, ao parece, em breve pai de novo – querendo dizer por «parábola imperfeita» o que não teve coragem de dizer de uma forma clara e politicamente relevante. E até poderia dizer o que pensou e ensaiou (daqui, não sendo o Zandinga, leio o seu pensamento e percebo o que o deputado queria dizer e faltou-lhe coragem e engenho) pois a matéria do carácter dos políticos é uma questão política relevante que não é externa ao Parlamento nas sociedades com valores democráticos consolidados.

Orlando Dias falhou na forma.

(ii) Para o Primeiro Ministro, pois a acusação – como feita, e pelas razões feitas – indignifica-o ex natura. E, notemos, nesta questão de mulheres tenhos demasiados pecados a expiar, pelo que olho primeiro pra a minha trave antes de olhar para o argueiro do outro (mutatis mutandis, seja dito!).

A substância poderia ter crucificado politicamente José Maria Neves; ao vivo.

O Presidente da Assembleia Nacional tocou o gongo, quer dizer: suspendeu os trabalhos da sessão parlamentar. Justificou, com isso, a confiança do lugar. Fez bem? Se percebe o que digo, tire as suas conclusões. Eu nasci de uma mulher, não como o Mestre dos que sabem pensava que emergia a vida; por isso não vou por aí... é mais por onde se deve ir.

O deputado José Manuel Andrade chamar o colega de Louco… não sendo vernáculo parlamentar é… interessante. Os deputados deveriam ler O Louco de Khalil Gibrain, um dos meus livros de poesia preferidos. Ser-lhes-ia útil, creiam-me. Agora, dizer que o deputado Orlando Dias é louco… até que pode ser um elogio ao deputado!, se feita analogia como a que Erasmo de Roterdão fez a Thomas Morus (Patrono dos estadistas e dos políticos, por decisão papal – de João Paulo II, segundo me diz a memória) ao escrever um dos livros mais extraordinários que já li: Elogio da Loucura. – «E que elogiava Erasmo no grande político (com Papiniano também Patrono dos Advogados) da Corte de Henrique VIII?» – perguntar-me-á.

Este, estando casado com a princesa Catarina de Aragão, resolveu repudia-la – anulando o seu casamento – para casar com Ana Bolena (por que se caiu de amores, ainda que haja quem diga que foram outras artes). Thomas Morus opôs-se às pretensões do Rei, por considerar a decisão injusta para com Catarina de Aragão (Oh! pobres mulheres que sofreis os pecados da libido incontrolável dos homens em eminência…). Esta decisão – louca porque contra natura para muitos, os que pouco têm na alma e pouco se respeitam – custar-lhe-ia a vida: deceparam a sua cabeça. Morreu com razão, e hoje é o Patrono dos Estadistas e dos Políticos. (Quando releio passagens da Utopia penso no que poderia ter escrito mais…que mais e outro Rafael Hitlodeu poderia escutar, hoje, quando quero o furação. Penso que Henrique VIII matou-o porque ele era humano, e muitos homens ao mesmo tempo. Enfim… outro Parlamento.)

Mas… Quis o deputado José Manuel Andrade dizer que o deputado Orlando Dias era louco como Jona Matá Poss ou como Thomas Morus? A primeira afirmação é uma ofensa (a honra interna e externa são feridas pela «difamação»; sem desprimor para Jona Matá Poss) com defesa cabida no Regimento da Assembleia Nacional e, como bem jurídico, tutelado no Código Penal; a outra é um elogio extraordinário. Eu, se fosse o deputado Orlando Dias – este «se» é mero exercício retórico pois não tenho capacidades para tão elevado cargo da res publica – faria como dizia Shakespeare: «Quanto te ofenderem, eleva a tua alma a ponto tão alto que a ofensa não te atingirá». Neste caso, elevar a alma ao ponto da loucura de nunca se transigir no que aos princípios dizem respeito. Essa era a loucura do Lord Thomas Morus.

Elogio da moria, da loucura… como diria Erasmo. Mas os loucos e os políticos desse tempo eram outros, eram outros… e, com Thomas Moore, tenho de dizer que «aspiro, mais do que espero»: ter um Parlamento de loucos pela verdade e pelo bem-estar de todos os cabo-verdianos pois quem não age assim fique sabendo que é como dizia Lord Russell: «não consideres que valha a pena proceder escondendo evidências, pois as evidências inevitavelmente virão à luz» o que é o mesmo que dizia Jesus Cristo: não se pode esconder uma candeia debaixo da mesa. Que diferentes eram estes dois homens! Néscios, cada um a seu modo e tipo de moria; mas podiam com ela. Iss ta’guentá n’sis canela!

A diferença de opinião não é uma guerra; é somente perspectiva – por vezes de interesse, por vezes ética, por vezes moral. Os loucos olham sempre para cima, e partem sempre de cima; por isso são loucos aos olhos dos comuns dos mortais. A verdade tem sempre uma dimensão suicida... Yeshua ha-Notsrí e Thomas Moore que o digam... 

Imagem: Margaret Roper Rescuing the Head of Her Father – Lucy Madox Brown (1873)

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