- O DIREITO, O TORT E O JULGAMENTO DO PAPA
Richard Dawkins, um ateu confesso contratou um Advogado britânico para responsabilizar o Papa Benedictus XVI pelos crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexual das crianças (a chamada pedofilia) cometidos por sacerdotes católicos ao longo dos anos. A ideia é levar Benedictus XVI a julgamento, considerando a dimensão dos crimes em causa. O efeito copy cat não demorou: o Vaticano e o Papa foram processados nos Estados Unidos da América.
A acção de Richard Dawkins está fadada ao insucesso ab ibnitio, a não ser que encontre um Procurador e um Juiz — como diria Joaquim Barbosa, Ministro do Supremo Tribunal do Brasil — que dê «um jeitinho», o que não é nenhuma impossibilidade. Mas isso não é direito, é outra ordem de razão. É que no plano do Direito Internacional Público, do Direito Internacional Penal e do Direito Penal Internacional, mesmo tendo em conta a jurisdição universal, falha a dimensão subjectivo do direito penal para se poder imputar qualquer crime ao Papa Benedictus XVI e ao Estado do Vaticano.
A Santa Sé não tem reagido da melhor forma, mas nem por isso os seus prelados poderão deixar de dormir descansados no que concerne à acção de Richard Dawkins & companhia. No que concerne aos Estados Unidos da América, a situação é/será a mesma no plano penal, mas não no âmbito cível. É que neste, e segundo o Alien Tort Claims Act (ACTA) de 1789, a Igreja Católica e o Vaticano — e não os Papas João Paulo II e Benedictus XVI — poderão ser processados e os autores lograrem sucesso no que concerne a se conseguir uma indemnização compensatória. E isso porque a Igreja e o Vaticano são responsáveis pelos actos dos seus agentes, se é que não o serão elas mesmas merecedoras de censura, por negligência e no plano omissivo.
A verdade é que parte dos objectivos de Richard Dawkins já forma alcançados: colocou a Igreja em cheque e faz as pessoas questionarem Deus, como se este tivesse algo a ver com as acções livres ou não (no caso não são, pois resultam, em regra, de uma patologia). A Igreja católica Apostólica Romana é sujeita a um julgamento publico, sendo que quem o deve(ria) ser são os sacerdotes inadimplementos dos seus deveres para com a Deus, a Igreja e o seu semelhante. A consequência necessária deste facto é que a Igreja terá de passara a usa o teste de Rorschach nos Seminários, e eliminar os que chumbarem no mesmo. É que o sacerdócio não pode ser refúgio de ninguém, e muito menos dos medos de seja quem for de encarar os seus problemas pessoais.
A vocação não pode ser bastante, é preciso mais. O mais que faz o Sacerdote ser uma pessoa qualificada para o serviço ao outro. Somente um juízo prévio sobre a personalidade do candidato a sacerdote pode evitar que o tort da acção pedófila não seja encarada como um facto infeliz que precisa de um remédio. Mas até que digo mais: todos os sacerdotes deveriam sujeitar-se ao teste de Rorschach, pois permitiria identificar pedófilos e aqueles com tendências a sê-lo. Medida draconiana? Talvez o seja, mas a integridade da santidade do sacerdócio e a segurança das crianças justificam uma tal medida. Julgamento por julgamento, este resultaria o verdadeiro — o único com efeitos práticos no presente e no futuro. Mas quem o quer? Quem o deseja?
Já agora: por onde andavam, durante todos estes anos, os ora egrégios guardadores de crianças que se apresentam e se arvoram campeões da infância? E Darwin tinha razão! Mas prefiro a sua razão na voz de Espinosa: connatus essendi. Ontem e sempre; pois, ao contrário do que dizia Séptimo Severo e os poetas, mudam-se os tempos mas não se mudam as vontades. E o Direito, na perspectiva de muitos, continua a ser instrumento e não valor.
Imagem: Le Modele Rouge III, Magritte
2 comentários:
Meu caro, neste caso, acho que a Igreja se pôs a jeito para levar com tudo isto em cima pois devia proteger as vítimas e não os criminosos.
Amílcar, é uma evidência que a Igreja católica revelou inabilidade a lidar com a questão. Agora, a questão é bem mais complexa do que parece...
Abraço fraterno,
e bom fim de semana
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