domingo, 1 de agosto de 2010

  • OS CRIADORES

Era uma tarde do ano 70 AD
e aconteceu um milagre de eras…
Um soldado de tez negra e coração de luz
estacionou os olhos e a ambição na Hispânia
outrora banhada com o Mar nomeado sua geração.

Era uma tarde como esta noite
e sabia à noite magrebina quando de razão
juntou o pomo de oiro ao suor das odaliscas santas
e escutava como eu escuto os nossos antepassados
a raiar sonhos em penas
antes de serem o que já são.

Dizem os poetas e os contadores de histórias
que as chibatadas mouras e de sal que fenderam alma
e carne de Jabal Al-Tarik e da sua razão
sabiam-nos a mel.

Traziam, sabiam-no, a civilização
aos antigos escravos dos nossos antepassados
– Amílcar Barak e seu sémen e seu sonho –,
despertavam os bárbaros adormecidos em banho de trevas.

Abriam as portas à Europa bárbara,
as chicotadas de inveja cega do Califa Muça Ibn Nusayr.

Era uma tarde como a noite de hoje
– o calor gemia
com a carne lacerada do soldado e da razão
enquanto um destronava Hércules da memória
e se tornava Gibraltar
outro fendia o seu sangue e raízes à terra
e nascia a Europa mestiça, a mãe renegada do Sul.

Era uma tarde gemendo de calor e rasgos
na negra pele e nos sonhos de Jabal Al-Tarik.
E o soldado caminhará sobre a grande Fortaleza
enquanto a terra for terra,
enquanto a etenidade germinar de mim...
----- Virgílio Brandão, 01-08-2010

Imagem: Triunfo da Morte - Pallazo Abatelis, Palermo

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