sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

DEMOCRACIA REPUBLICANA OU NOVA DEMOCRACIA

Reli, no passado fim-de-semana, o livro «Cabo Verde, A Revisão Constitucional de 2010 e o Advento da Nova República» de David Hopffer Almada. Precisava de uma nova leitura, de dar espaço e oportunidade a mim mesmo para ter outra leitura do texto. Lembrei-me, então, entre outras coisas, do relativismo democrático de Corsino Tolentino e de outras pessoas do PAICV, de vários tiques autoritários do presente Governo e, também, de um namoro institucional à substância do passado colonial e de uma efectiva tutela espiritual e académica da Metrópole sobre a maioria dos cabo-verdianos que o Doutoramento Honoris Causa que a Universidade do Mindelo concede ao Professor Doutor Adriano Moreira é somente a ponta do iceberg.

(Podemos ter deixado de ter o colonizador no plano jurídico e político formal, mas não deixamos de o ter noutros aspectos, nomeadamente na alma; nomeadamente como modelo social de referência.)

É uma questão democrática? Sim, da Democracia Republicana que não temos em Cabo Verde. Temos o nomem mas não os benefícios da substância; pelo menos o povo, o suposto soberano, não os tem.

A democracia é, supostamente, uma forma de Governo tutelado pelo povo e que trabalha para o povo (lembro, aqui, Abraham Lincolm). É, desde que foi concebida, uma forma de controlar o uso inadmissível do direito ou do poder de governar. Hoje, perante os abusos e a incapacidade de governar que verificamos em vários quadrantes, é legítimo questionarmos esta forma formal mas antidemocrática de Governar. Até parece que estamos num sistema oligárquico ou aristocrático em que o poder passa de pais para filhos, de geração em geração, e sempre dentro de uma esfera social criada e alimentada ou pelo poder social do dinheiro ou pelos partidos. As mamas de onde sai o leite parecem serem, sempre, as mesmas.

O povo não suporta mais uma justiça injusta, por vezes democrática e legalmente nepotista, que vê o interesse formal das coisas e não a razão do direito e da Justiça.

O povo não suporta mais estes governantes de barriga grande e dupla queixada que só procuram enriquecer rapidamente enquanto o povo definha na periferia da sua barriga mirrada.

O povo não suporta mais a democracia de fachada, essa do estado que se diz independente mas que baixa as defesas para ser violada pelos deputados da nação.

O povo não suporta mais ser quem paga a crise económica, social, ética e moral da nação. Incapazes funcionais não só não podem como não devem governar.

O povo não suporta mais uma democracia que não é Republicana mas uma mama de meia dúzia e suas famílias. Não é uma questão de paradigma, não. É uma questão de termos uma coisa pública digna e justa; o que não temos.

O povo quer uma Republica de Cabo Verde que seja seu, de todos os cabo-verdianos, não de meia dúzia de famílias ou do lobby político-partidário de algumas áreas localizadas do país. O povo está farto de viver com tostões, e ver quem os representar viver como se tivessem milhões – e por vezes assim é. O Governo não é nem foi nomeado para fazer negócios ou criar lobbies institucionais e familiares, não. O Governo foi eleito para governar, e bem.

O que fazer? Como fazer? – perguntar-me-á.

Será preciso uma nova revolução global – uma primavera popular global – para a humanidade recuperar os ganhos civilizacionais que, nos últimos séculos (com rastilho da Glorious Revolution e das revoluções americana e francesa), granjearam esperanças legítimas de construirmos uma humanidade justa e fraterna? Talvez seja necessário – e muito provavelmente será necessário – ou talvez não. Talvez não, se entendermos que o Mundo como um todo fraterno, se entendermos que a República não é de alguns mas de todos. Assim como os ricos estão condenados a ter os pobres à porta em busca de pão; assim a democracia opressora está condenada a cair sob a força da razão e da razão da força que o povo, também, tem quando é necessário. A balança da história tem de pender, ou para o bem necessário ou a revolução necessária.

Se calhar algumas sociedades, como a cabo-verdiana – pela sua natureza geomorfológica e social –, deveriam optar por uma democracia directa ao nível de cada ilha e/ou comunidade, e deixar poderes residuais de representação externa a um executivo sujeito a euthyna global anualmente.

Os magistrados, com função jurisdicional e obrigados a aplicar directamente as normas jurídicas internacionais no âmbito dos direitos humanos, seriam eleitos directamente pelo povo – de entre as pessoas com formação jurídica adequada e a quem a comunidade reconhecesse ius prudência para julga-la. Estes teriam mandato limitado e renovável (sujeito a limite de mandatos). Politico ou magistrado corrupto seria punido com pena de prisão equivalente a metade da sua idade biológica e com opção voluntária de expatriamento a 1/3 da pena.

O povo livrar-se-ia, assim, dos que não têm consciência do que é Justiça e brincam – sob uma Beca de impunidade das suas acções sem escrutínio democrático – com a vida e os direitos fundamentais dos cidadãos. Os juízes dos tribunais superiores seriam escolhidos, por mérito e ius prudencia dos mesmos, pelo executivo eleito e encabeçado por Presidente com mandato único e limitado.

Precisamos, mantendo os valores substanciais do Estado de Direito Democrático, de reinventar as formas governar a Polis – a cidade, a nação. E com incapazes, corruptos, traficantes de influências, lobbistas, nepotistas e quejandos é que não vamos lá. O povo poderia ser povo se fosse mais cidadão, mais fiscal do poder. Mas não é. Este é uma nota de hoje; vésperas de 10 de Dezembro de 2011. E tudo pode morrer hoje que, garanto-vos, haverá quem esteja a estripar o povo. Um dia dirá basta. E será, então, a guerra justa de que Tomás de Aquino e Hugo Grócio falavam. Um rotundo não à opressão, que pode ser democrática; quando a democracia é relativa, pragmática. Esta é inaceitável pois é de uma sociedade em que o homini lupus homini – voraz consumidor, segundo a lei da evolução natural de Darwin – não tem freios. Ai de ti, pobre. Ai de ti que sabes o que é coluna vertebral…

1 comentário:

Ariane Morais-Abreu disse...

" Precisamos, mantendo os valores substanciais do Estado de Direito Democrático, de reinventar as formas governar a Polis – a cidade, a nação." Pleinement d'accord avec toi!!! OUI, les Cap-verdiens doivent oser "réinventer" la construction de leur propre devenir... C'est une lutte sans fin, et sans faim!!