sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

| UM GOVERNO DE MULHERES E A VIOLENCIA

Trabalho, e oiço «Palavras Cruzadas» na RCV. Ao voltar a ouvir falar de mais situações de violência doméstica – nomeadamente de uma jovem chamada Sueli que se queixa de tortura e de uma outra, agente policial que, por ter sido baleada pelo ex-companheiro, não acredita na Justiça – cimento a minha convicção de que é necessário uma acção enérgica e dura nesta matéria da violação dos direitos, liberdades e garantias fundamentais da mulher. Não resisto a lavrar esta nota, e lembrei-me de Óscar Romero e da sua apologia de uma outra violência – a violência do Amor .

«Jamás hemos predicado violencia.
Solamente la violencia del amor,
la que dejó a Cristo clavado en una cruz,
la que se hace cada uno para vencer sus egoísmos
y para que no haya desigualdades
tan crueles entre nosotros.
Esa violencia no es la de la espada,
la del odio.
Es la violencia del amor,
la de la fraternidad,
la que quiere convertir las armas
en hoces para el trabajo.»

Mas também fiquei a reflectir num aspecto curioso: o presente Governo de Cabo Verde é um Governo de mulheres – com oito ministras, uma das quais dirigindo a pasta da Justiça – e alguns problemas estruturais e endémicos continuam a ser as mesmas. Algumas destas mulheres políticas são particularmente esclarecidas, mas parece-me que a sensibilidade social para algumas questões – nomeadamente uma solução musculada para a violência doméstica e um ataque às causas profundas que levam a que a maioria das causas da pobreza que alimentam em grande parte a situação de sujeição social e moral da mulher sejam resolvidas – não acompanham as qualidades que revejo em algumas e, confesso, admiro.

Um Governo de mulheres sem a dimensão do proclamado «poder no feminino», sem a sensibilidade feminina? As mulheres políticas, provando as razões da asserção de Lord Acton, masculinizam-se no poder ou, de um modo mais simples, perdem a sensibilidade social e a consciência ética das mulheres cabo-verdianas em geral? Estas são, por natureza, violentamente amorosas. A realidade fala por si, e merece reflexão. Um connatus essendi político não explica tudo, seria demasiado óbvio. Mas se calhar até é… pois o mundo é feito, também, de perplexidades.

Imagem: Zoya Kosmodemyanskaya, morta, foto de Sergey Strunnikov do jornal Pravda

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