terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

| DE EZRA POUND A AUNG SAN SUU KYI

A história da política da modernidade está pejada de situações que me causam  perplexidades – mesmo considerando-as no seu tempo histórico. O caso de Ezra Pound – em plena América democrática – é uma delas. Ezra Pound esteve, durante 13 anos, preso sem culpa formada – a imagem do que acontece hoje com os prisioneiros de Guantanamo, só que ele era um preso político dos Estados Unidos da América. A razão? Diziam que estava incapaz, doente mental, mas não: era um prisioneiro político por ter defendido teses políticas próximas do fascismo italiano. Paradoxalmente – ou não, se atendermos à lógica da história dos vencedores – Winston Churchill defendeu o Duce Benito Mussolini chamando-o de “o maior legislador vivo” quando pensava que o fascismo era uma forma de fazer frente ao “perigo socialista” que vinha da URSS. E hoje, ainda hoje – de Burma a Cuba, passando pelo Irão – existem pessoas cujo único delito é pensarem e falarem de forma diferente do establisment político.

Ezra Pound foi internado num asilo de loucos, Mandela, Aung San Suu Kyi e os dissentes chineses, iranianos, cubanos… em cárceres para delitos comuns ou em prisão domiciliária. A diferença para estas pessoas, como foi para Mandela e Ezra Pound, é saberem que não são esquecidas, que há quem se importa com elas – mais: que se importam com a sua luta, com os valores de liberdade de pensamento que defendem (não se tem de concordar com a substância, mas sim com o princípio). Ezra Pound era visitado com frequência por Edith Hamilton, o que lhe servia de grande consolação. E de que falavam? Estas conversas são, de certo modo, vertidas no Cantos; e Ezra Pound esclarece: “de litteris et de armis, praestantibus que ingeniis”; i.e., de livros e de armas, de mentes extraordinárias quer do passado quer do presente (Ezra Pound, The Malatesta Cantos, 98).

A consolação da filosofia, como diria Boechio, ou a prova de que Gregório Magno tinha razão e Amor ipse intellectus est (o Amor em si é o princípio do conhecimento)? Num Mundo que derrapa à alta velocidade, bom seria que fosse uma coisa e outra coisa. |

Imagem: Ezra Pound

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