segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

| IMPORTEMOS O ANTINEPOTISMO DO BRASIL

Quando era menino, estudando no Liceu Bedjo no Mindelo, um professor que tinha o mau hábito de beber cerveja na sala de aula enquanto comia uns pasteis de milho quentinhos, resolveu ensinar aos alunos uma regra que, na altura — assim como hoje —, me pareceu batota. E disse-nos que em situação de dúvida sobre a forma correcta de escrever uma palavra, deveríamos escrever das duas formas, e uma haveria de estar certa. O professor, ao fazer a correcção pensaria que o aluno redactor sabia escrever a palavra da forma correcta, somente se tinha enganado (um lapsus scribendi, diria hoje) na forma de escrever — sabia, pelo que a forma errada não poderia ser considerada erro. O professor corrigiria o erro, e o aluno ficava a saber como era a forma correcta. E não teria erro, a marca vermelha no caderno… esperteza mindelense, pois claro — dir-me-á. Mas será mesmo?

Cabo Verde, que copiou a solução brasileira para a extradição de cidadãos cabo-verdianos (com a lógica discriminatória de cidadãos nados e naturalizados) durante o processo de revisão da Constituição bem que poderia ter copiado, também, outras soluções, como, por exemplo, a do Salário Mínimo e a do acesso a cargos públicos como entendido pelo Supremo Tribunal Federal do Brasil. Sobre este, deixo à consideração dos leitores de Terra-Longe a Súmula Vinculante nº.13 de 21 de Agosto de 2008 e do que dizem, e bem, os Ministros do STF (sobre a forma, parece-me ser desconforme com a lógica do Estado de Direito, mas isso é outra questão):

«A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança, ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.» Isto é, o Artº.37º. da Constituição Federal.

Copias selectivas, que dá jeito ao poder político e não povo? Se não é assim, parece. E, por vezes, o que parece é. E coisas há que parecem-se tanto com a realidade que não podem ser miragem mas realidade. Importemos, além das novelas, das sungas, do samba carnavalesco e a discriminação dos cidadãos pátrios as muitas coisas boas que o Brasil tem: importemos o Salário Mínimo, importemos o anti-nepotismo, já!

Para depois, para depois fica Deus. Um dia importaremos Deus, e poderemos dizer que Deus é cabo-verdiano. Teremos alegria a rodos, gás natural, ouro, petróleo, uma terra agrícola fértil e uma economia a crescer — como aconteceu com o Brasil: descobriu que Deus era brasileiro e deixou-o crescer, até ter idade para, agora, estar a trabalhar e a dar pão ao povo brasileiro e a outros que ainda não importaram Deus de algum lugar. Mas podemos começar, já, por agora, a importar o antinepotismo.

Andy Warhol — Still Life (polaroid exhibition)

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