HERÓIS INSTRUMENTAIS
Ontem, ouvindo a RCV, fiquei com a sensação de que tinha viajado no tempo, que estava nos primeiros anos depois da Independência. Absolutamente único! Em tudo. Até no herói. Amílcar Cabral é um herói de Cabo Verde, mas o dia não era dos heróis? A RCV fez uma interpretação ontologicamente subversiva e, na prática da sua emissão, considerou o PAIGC/CV um herói, pois tudo soou a uma imensa propaganda do partido no poder, a um deja vu da propaganda política pós independência.
Adivinho que isso irá acontecer, depois. A datas das eleições devem ter estas coisas em consideração, pois a política é muito mais do parece. E o que parece em regra é, pois a realidade não se engana; ainda que a nossa realidade se deixe enganar. Foi uma forma de festejar o PAIGC/CV e não os heróis nacionais – como é o caso merecido de Amílcar Cabral, pelo humanismo objectivo da nossa luta contra o jugo do poder colonial e que ele soube corporizar ao dar a voz e a vida por ele –, uma forma subliminar de afirmar um herói colectivo, a «força dirigente da nação».
Não vale a pena construir heróis colectivos, pois se existe um herói neste plano ele seria uma ela: a nação cabo-verdiana que se reinventa todos os dias nas nossas gentes, com as nossas mulheres a terem os mesmos problemas que Amílcar Cabral via a sua mãe sofrer: a exploração da sua mão obra. A confusão sobre o que é um herói é a mesma que grassa por aí sobre a fama. Esta seguia aquela. Ai Aquiles! Ai Mário! Ai Marcelo! Ai Aníbal Barak! Ai Damien de Molokai!
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