terça-feira, 26 de janeiro de 2010


  • OF WOLVES AND MEN
Isso dos lobos e dos cordeiros já chateia. O Primeiro Ministro José Maria Neves percebeu muito bem o que o Presidente do MPD, Carlos Veiga, quis dizer na Convenção do MPD. E se não percebeu, fico decepcionado, de todo. É que tenho-o como um homem inteligente, pelo que só posso concluir que não quis perceber ou procura uma justificação para fazer uma clivagem desnecessária entre os cabo-verdianos e imputar isso a Carlos Veiga. O que o líder do MPD disse não foi nenhum atentado à honra ou dignidade externa de ninguém. Agora, se o Primeiro Ministro insiste num desagravo é porque, ao nível interno se sentiu agravado. Quer isso dizer que é ou se sente um lobo? Para isso não tenho resposta, só perguntas.

O rei Leandro dizia que um grande general ou estratega deveria congregar as características do leão e do lobo. O maior elogio que conheço, até hoje, sobre Aníbal Barak era que ele tinha estas duas características, e talvez por isso mesmo foi grandioso e era denominado Barak, O luminoso. Este é um facto da ciência política, de conhecimento necessário. Ser lobo, quer no sentido naturalístico quer na perspectiva do darwinismo social, não é mau, pelo contrário – tem a dimensão de um elogio no plano político. É, mutantis mutandis, estar num patamar superior da cadeia alimentar em relação ao cordeiro. Este, em regra, se puro, era destinado ao sacrifício – como acontecia no lugar santíssimo do templo de Salomão; caso fosse falho de pureza era alimento de lobo e outras alimárias ou dos homens em dias normais ou de festa.

Carlos Veiga sabe que tem mais que fazer, e não se pode dar ao luxo de lutar contra o poder instituído e a inércia do poder com a mesma lógica usada por Jorge Santos, que caiu na armadilha de perder tempo com o acessório do mentiroso, do burro, da ladeira… e de fazer uma oposição ao reboque da Agenda do líder do PAICV e as acusações de ligação ao narcotráfico e questões quejandas. O Primeiro Ministro, para ser consequente com o que pede a Carlos Veiga, poderia começar por lavrar um pedido de desculpas sobre as acusações que fez ao MPD, no dia das últimas eleições legislativas. Estas sim, foram e são ofensivas. Ou tem as provas e as apresenta no local próprio, ou pede desculpas.

O país não pode nem deve viver num clima de crispação política desnecessária, e muito menos de suspeição. O Primeiro Ministro deve fazer o que o povo o autorizou a fazer ou conceder-lhe o presente mandato: governar o país. Carlos Veiga deve concentrar-se no seu papel – dirigir a oposição e fazer oposição. Uma oposição séria e intransigente na defesa dos interesses dos cabo-verdianos e da nação. A tarefa é árdua, mitologicamente árdua, com a ingenuidade que o grupo parlamentar revela em algumas matérias. Ontem, na Assembleia Nacional, o PM José Maria Neves – depois dos ministros conseguirem escapar à questão do financiamento do INPS à ELECTRA –, respondeu que o Governo sabia e autorizou o negócio. E disse isso no encerramento do debate! E o MPD já nada podia fazer para obter os esclarecimentos necessários – que o debate parlamentar não esclareceu – e que se impunham. Foi engenhoso, predatório até, neste aspecto e no de, ao que parece, apresentar soluções para tudo e mais alguma coisa.

A panaceia da governação parece que sai da cartola. Mas não sai. O mundo é mágico, mas não é de mágicos – muito menos na política. E como os lobos não deixam muitos cordeiros dormirem, e como muitos cordeiros não deixam muitos lobos dormirem; logo, lobos e cordeiros andam acordados, decidi editar em terra longe (depois, depois de lido este texto) a Epistola dedicatória de Thomas Hobbes ao Conde de Devonshire na Introdução da sua obra O Cidadão. Quando não se é ofensivo, o discurso político, quer retórico quer dialéctico, é uma mais-valia para os cidadãos. E se há coisa que não se pode pedir a um homem é que peça desculpas pelo seu pensamento. Só um homem não livre, agrilhoado nas suas convicções, moralmente cobarde e pusilânime de ser pede desculpas pelo seu pensamento. E somente uma sociedade ou uma ou uma autoridade autoritária pede aos seus cidadãos que se retractem do seu pensamento, que tenham vergonha de pensar e de dizer o que pensam – em particular no plano político.

Voltaire sintetiza esta ideia numa asserção: «posso não concordar com o que dizes, mas lutarei até a morte para teres o direito de dizer o que pensas.» resta, nesta ideia, a essência da liberdade de pensamento e de expressão inerente ao Estado de Direito Democrático, o princípio da liberdade política – a liberdade política e cidadã que teve início em 13 de Janeiro de 1991 e que o PAICV diz que começou com a revisão constitucional de 1990. Assenhora-se desta ideia de liberdade, mas o seu líder tem um discurso que contraria esta ideia de liberdade e pluralismo discursivo. Quem age assim está aquém dos parâmetros valorativos de uma sociedade enformada pelo Estado de Direito Democrático – é um predador do pensamento do seu semelhante, um lobo da liberdade do outro. Não sei se Carlos Veiga, Presidente do MPD, pensa assim, mas eu, como cidadão, penso!

2 comentários:

Anónimo disse...

À medida que se aproxima as eleições de 2010, as tuas veias neo-liberais e veiguiStas fica mais acentuado e bem definido.
Milton Reis.

Virgilio Brandao disse...

Caro Milton,
vê o que quer e conclui o que quer. Isso é a liberdade de todos e cada um.

Abraço fraterno