| A FALENCIA DA AUTORIDADE DO ESTADO E OS TUGHS
Lia a correspondência entre S. Paulo e Séneca, e fiz uma pausa para escrever um poema. Mas Séneca ficou-me na memória, a dançar no limbo dos meus pensamentos com uma tranquilidade necessária. Mas, de repente, grita! A causa? Faço uma visita aos jornais on line e eis que leio algo que me deixou estupefacto: «Vamos promover um encontro, proximamente, com todos os grupos de thug’s da Praia, para dialogarmos, para conversarmos», José Maria Neves, Primeiro Ministro de Cabo Verde, dixit. Um absurdo político, no mínimo.
O Primeiro Ministro pode estar vestido com toda a boa intenção deste Mundo, mas o que propõe é um absurdo e não vai, de forma alguma, contribuir para debelar a criminalidade no país, pelo contrário — só irá reconhecer, de facto, que estes grupos criminosos têm um poder efectivo sobre a sociedade cabo-verdiana e que são capazes de condicionar o poder político e levá-lo a dialogar com eles. O estado não se verga, não pode vergar quando estão em causa os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos!
O Estado e os órgãos de soberania representativos dos cidadãos não dialogam com criminosos e associações criminosas! O Estado e os órgãos de soberania dialogam com seus pares e/ou com instituições legítimas, legais e com fins bons e justos. A prevenção criminal não se faz com qualquer tipo de negociação com grupos organizados ou não de delinquentes, mas sim com formas legítimas de prevenção e com repressão adequada daqueles que querem sequestrar a sociedade cabo-verdiana. E se é verdade que o Governo sabe quem são os grupos de thugs (que quer dizer «assassinos» — nada menos), só tem de fazer uma coisa: passar essa informação ao Ministério Público de modo a que este, de acordo com as suas competências constitucionais e legais, possa agir em conformidade.
O Governo, seja este presidido por José Maria Neves ou qualquer outro cidadão, não pode, sob pena de subvertermos a lógica democrática e a autoridade do Estado, de forma e modo algum sentar-se à mesa com criminosos — nomeadamente estes nominados ou auto denominados thugs, «assassinos» — para negociar seja o que for. É o Governo a claudicar na política de Segurança e de Justiça, em toda a linha. Eu, como cidadão, não compreendo nem aceito que o Governo do meu país se encontre com organizações criminosas, seja qual for o fim que se tenha em vista. Os fins não justificam os meios, e os males deste meio é a cedência da autoridade do Estado à criminalidade. Impensável!
Espero que o PAICV, o MPD, a UCID e o PTS sejam claros e digam à sociedade cabo-verdiana se caucionam este anunciado conclave entre o Governo e as associações criminosas da cidade da Praia. «Tudo me é lícito, mas nem tudo me convém» — é um velho conselho. Mas nem me parece que seja lícito, longe disso, que o Governo dialogue com organizações criminosas.
Mas isto não me admira, nada. Meses atrás trocava impressões com o confrade blogueiro cabo-verdiano e dizia-lhe, melhor, previa, o que vemos hoje — o aumento da criminalidade, o aparecimento dos militares nas ruas e uma solução milagrosa para este problema iria aparecer. Dizia-lhe que tal iria acontecer por estas alturas, com a proximidade das eleições. Previsível (basta ler-se O Príncipe de Maquiavel, não é? — pensará), mas existem limites e esses estão aquém de uma qualquer negociação ou diálogo com organizações criminosas.
O povo deu um mandato ao Governo, mas não é, de todo, para dialogar com organizações criminosas. Esta decisão do Primeiro Ministro, se levado a cabo, constitui um certificado de incompetência à política de Segurança e de Justiça do seu próprio Governo e do sistema judicial — a começar pelo Ministério Público. O que o povo reclama é segurança e justiça! O povo não quer, não pode querer, que o Primeiro Ministro se sente com organizações criminosas para dialogar. Que dialogue com o povo, com os representantes do povo, mas nunca com os algozes do povo! Dizia David, governante de Israel: «Bem-aventurado o homem que não anda segundo o conselho dos ímpios, nem se detém no caminho dos pecadores, nem se assenta na roda dos escarnecedores.» É um bom conselho, pois o diálogo social não abrange, certamente, os grupos de criminosos.
Estamos perante um erro calamitoso da governação que, assim, transfere a autoridade do Estado para organizações criminosas e torna o trabalho dos tribunais, nomeadamente no plano da prevenção geral do crime, uma actividade inglória, quase sem sentido neste plano. Haja quem grite, que levante a voz e diga ao Primeiro Ministro e ao Governo que o Estado não negoceia com «assassinos» e organizações criminosas! Mais: não se consegue negociar com três tipos de pessoas: os criminosos, os doentes mentais e os homens maus.
O meu grito vai daqui, de terra longe.
PS: Querendo Deus, partilho o poema amanhã...
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