sábado, 19 de junho de 2010

  • PROSTITUIÇÃO POÉTICA E DIVINA
Os autores de alguns blogs made in cv resolveram falar sobre a prostituição. Dos lugares comuns ao retorno à “legalização” da prostituição, como se ela fosse ilegal… passando pela confusão da prostituição com o abuso sexual de menores – isso sim crime! – há de tudo um pouco. Mas achei graça a sentença «A prostituição não tem nada de poético» do João Branco. E achei graça porque existe poucas actividades humanas com tanta poesia como a prostituição; aliás, o próprio acto de fazer poesia é menos poético do que a prostituição enquanto actividade.

Existe, sim, uma dimensão poética na prostituição; na verdade, a actividade é uma contínua expressão da comédia e da tragédia da personae que a vive. Mais: existe uma dimensão divina da mesma. Ah, pois! A prostituição pode ser uma arte, grandiosa e efémera. Uma cortesã não é um pedaço de carne, é muito mais do que isso quando exerce a sua função – é uma verdadeira actriz que se transmuta em efémera companheira, conselheira, contadora de histórias e fonte de prazer. Dá amor, o Eros desejado do seu corpo, e por momentos o companheiro cede todas as suas agruras e necessidades a ele. É um amor que tudo vence, no momento. E por isso Virgílio dizia nas Bucólicas: et nos cedamus amori (rendamo-nos também nós ao amor).

O mundo antigo percebia isso muito bem. E Chrisys de Pierre Louis – das obras que já li sobre o tema – é um dos livros mais maravilhosos da literatura do último século e que nos transporta à esta realidade da antiguidade Grega. E quando Rei descobre que a cortesã que visitava e pagava generosamente os favores sexuais era, na realidade, a sua Rainha…

O século XXI ainda é culturalmente opressor, e ainda não compreendemos muitas das dimensões da liberdade humana. Ainda não tivemos o Renascimento Sexual, e, paradoxo dos paradoxos, tal não culpa da moral religiosa, não. E, bem vistas coisas, a prostituição tem mais benefícios sociais do que malefícios quando vista como um exercício de liberdade e não é sujeita à pacóvia censura moral que, fatalmente, a remete à clandestinidade social. O engraçado é que os maiores moralistas são aqueles acabam por ser achados como clientes das modernas cortesãs.

A verdade é que prostituição verdadeiramente nociva é a moral; e o mal que dela emerge é ainda maior porque, como Baudelaire dizia a propósito do Diabo, a sua maior arma é convencer-nos de que não existe. E nestas coisas existe uma vingança poética, a espreita e a sorrir…

7 comentários:

Redy Wilson Lima disse...

Tens toda a razão: mea culpa. Não se pode legalizar o que não é legal. Deveria ser antes reconhecida como uma profissão como todas as outras.

Joshua disse...

Pois tens razão: é só banalidades quando se fala de prostituição.
Talvez porque é uma coisa banal, não?
Que mais se poderá dizer?
Nada.
Mas tu resolveste marcar pela diferença e vens falar da poesia e das cortesãs. E uma pessoa lê e pensa, hum...isto até dava para mim, role playing, sexo abundante como qualquer mulher liberada deve dizer gostar e ainda por cima só com quem agrada e recebo dinheiro em troca: eu quero!
E é assim que pensam muitas. Basta ler alguns livros de ex-profissionais para perceber...
Uau! É de facto divino mas para as maior parte das prostitutas isto só acontecerá no céu.
Para aquelas que eu conheço e que até entraram pelas razões certas na coisa, a vida delas o que tem apenas de poético é serem putas tristes.

PS: Há um certo pedantismo intelectual nesta tua nota, sabias?

Virgilio Brandao disse...

Redy, quiseste dizer ilegal; e percebi pois o princípio é que "é legal tudo o que não é ilegal". E concordo contigo: deve ser como as demais actividades económica e socialmente úteis – estamaos perante uma discriminação social tout court.

Joshua…
pedante, eu? Só pode parecer, pois sabes que estou tão longe disso como Shamayin da terra. Agora, posso dizer-te que, no plano intelectual diria o que dizia Albino Forjaz de Sampaio em "Palavras Cínicas"… há um preço para tudo!

Agora, no divino falava do plano histórico… quando havia prostitutas sagradas nos templos! Agora, que a actividade tem o seu quê de poético, tem! Até literatura a que referes – e a situação das cortesãs que conheces – é da ordem da tragédia…

Ah, e as coisas não se podem analisar pela maioria mas sim situação em si mesma...

Joshua disse...

Nem sempre.
Vezes há em que o céu está na terra...mas isso é coisa provavelmente mais para o teu poeta perceber.

Virgilio Brandao disse...

Olha, Joshua: perguntei ao meu poeta e ele disse-me para me lembrar do que está escrito no Jardim de Shalamar Bagh...
:-)

PS: Gosto da palavra sem/pre... e se se tiver um "nem" e um "para" a preceder, Deus! faz-me sorrir.

Joshua disse...

Se gostas de sem/pre, como é que nem para sem/pre te pode fazer sorrir?
8-)

Virgilio Brandao disse...

Isso agora...
:-)