segunda-feira, 21 de junho de 2010

  • O DIA DEPOIS DE SARAMAGO
Saramago já cinzas! Também o seremos, um dia. Poucos teremos a sorte de ter tantos anos de vida, e muitos menos as honrarias que a sua arte lhe devolveu; mas o mais espantoso é que – e nisso os homens não são iguais – ainda menos terão a coragem, mesmo errando e equivocando-se, de dizer o que pensam. Escrevia neste blog, a 7 de Outubro de 2000: «Esse Saramago, não fica em silêncio enquanto o mundo perece. Com ou sem razão, faz bem!»

O silêncio envolveu José Saramago; mas também calou parte da consciência do país. O dia depois de Saramago é um depois mais silencioso, mais carneiro. E muitos terão supirado de alívio; pois com ou sem razão incomodava muitos lobos, em particular os lobos vestidos de cordeiro. Discordava na forma e na substância de muito do que o homem José Saramago dizia – por vezes com falhas de razão clamorosas e que me deixavam espantado! – mas admirava e admiro parte substancial da sua obra como escritor e a sua coragem cívica e política... o que muita cidadania não é nem chega para ser capaz. 

O país não perdeu um grande escritor, não; perdeu um crítico social, que com ou sem razão nunca se calou, nunca foi cordeiro da maioria, nunca foi cidadão castrado como a maioria continua a ser. E invejo José Saramago, hoje! Afinal, ele sabe ou não sabe, neste dia depois de ser cinzas, qual é o sentido desta grande aventura. À minha fé tem hoje por hoje a certeza. E eu terei de esperar, com uma curiosidade que sabe a pão de mel num dia de fome…

Imagem: José Saramago

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