Hoje, vou a um funeral. Faz-me mal à alma – ainda que tenha como certo que um homem se vê na sua morte e não nas alegrias da vida –, sinto saudades do mar e de um outro futuro que tarda. Ah, deveria ser proibido morrer! – penso sempre. É de um jovem cabo-verdiano que abraçou o sonho da emigração e que acabou por descobrir que a forma mais fácil de ganhar a vida não era acordar de madrugada e chegar à casa ao fim do dia cansado. Mais uma vítima de outro tipo de corruptores que assaltam a alma da e(i)migração jovem.
Acabou, fatalmente, nas malhas da justiça mas não teve a infelicidade de ter conhecido a prisão. Foi meu cliente e acabamos nos tornando amigos, pois era uma pessoa simples, alegre, afável e estranhamente grato. Depois do julgamento e da leitura da sentença disse-me:
– «Dr., esta serviu-me de lição. Vou mudar de vida e pensar no meu futuro».
– Pois… Disse-lhe sorrindo, pois não acreditava que fosse capaz de mudar de vida – não daquela tão lucrativa, ainda que fosse por causa do seu filho recém-nascido. Ao saber que tinha ido para Cabo Verde, voltei a sorrir para mim mesmo, agora feliz por me ter enganado.
Mas voltou à Lisboa. Falamos uma vez ou outra, aconselhando-o a “ter cuidado” e “juízo”. Há pouco mais de um mês, os irmãos e demais familiares deram-me a notícia de que o mesmo, depois de ir encontrar-se com uma pessoa, tinha desaparecido sem deixar rasto. Coisa estranha nele, pensava a família.
Há dois dias recebi um telefonema do cunhado. O seu corpo tinha fora encontrado na mata do Monsanto em Lisboa. Estava morto, presumivelmente assassinado.
O futuro tranquilo em Santana – Santiago – que procurava construir em Terra Longe desapareceu aos 29 anos; os sonhos ficaram a rastejar entre os dejectos da prostituída mata e deixa aos muitos amigos um exemplo sobre os caminhos que não se devem trilhar. Espero que a sua morte não tenha sido em vão.
Sem comentários:
Enviar um comentário