terça-feira, 18 de agosto de 2009

  • QUANDO O BEM QUE SE FAZ COMPENSA O MAL CAUSADO

A imagem que os políticos têm de si mesmos é extra ordinária, e por vezes construída pelo mito e pela propaganda política. O povo, em regra, ou segue essa construção ou tem uma outra perspectiva dos mesmos. Assim aconteceu com Tito Vespasiano. Plínio, o Velho, ao escrever a sua História Natural elogia o general Romano de tal ordem que chega a ser impressionante. Diz-nos que (Plínio o Velho, História Natural, II, V, 18). «Um mortal ajudar outro mortal: isso é Deus; e este é o caminho para a glória eterna; nesta via seguiram os nossos eminentes romanos, nela segue agora, em passo celestial, com os seus filhos, o maior governante de todos os tempos, Vespasiano Augusto, vindo em auxílio de um mundo exausto».

Mas será que é assim mesmo? Tito Vespasiano, que viria a ser conhecido pelo cerco cruel que fez a Jerusalém, tendo, em 69 d.C, depois de aclamado imperador romano, deixado o cerco da cidade ao filho, Tito Vespasiano que, em 70 a.C., destrói Jerusalém, não deixando pedra sobre pedra do templo de Salomão – como Jesus Cristo previra: o templo, forrado a ouro, depois de incendiar-se o ouro derreteu e os legionários romanos levantaram pedra sobre pedra para retirar o ouro. É esta destruição de Jerusalém, e o grande exílio forçado dos judeus que se lhe seguiu que é, ainda hoje, a causa mais remota do conflito palestiniano. Flávio Josefo, na Histórias das Guerras Judaicas (de que existe edição espanhola: Las Guerras de los Judios, editora Clie, Barcelona), diz-nos que Tito Vespasiano chorou com a destruição causada com a destruição de Jerusalém.

Seria, a seu tempo, assentado entre os deuses – pela apotheose: inter divo relatus est. No Arco de Tito, no Fórum de Roma, encontramos as inscrições que provam a sua grandeza que Plínio o Velho previu e não viu de todo (Tito Vespasiano sucederia o pai no Imperium em 79 d.C., no mesmo ano que Plínio o Velho morre, vitima da erupção do Vesúvio que o surpreendeu na sua residência nas proximidades de Pompeia). A inscrição Senatvs Popvlvs Qve Romanvs Divo Tito Divi Vespasiani f(ili)Verspasiano Avgvsto, é uma expressão da sua grandeza como pater patriae pois representa o verdadeiro espírito de Roma, a bandeira das legiões: SPQR (Senatus Populus Que Romanus=O Senado e o Povo de Roma).

O mal feito ao povo judeu foi apagado pela história, pelo bem que acabou por ser esquecido pelo bem que fez a Res Publica – tomando emprestado uma expressão do Senado romano a propósito de Septimio Severo. A vitória em Jerusalém, ter enfrentado com proficiência algumas desgraças – como caso da erupção do Vesúvio – e ter sido o imperador do cimento e das obras públicas (como a inauguração do Coliseu) granjearam-lhe a eternidade como um bom governante. Mas o mal social, humano e cultural causado com a destruição de Jerusalém – e as suas consequências seculares – são expiáveis com uma boa governação?

Imagem: Pormenor do Arco de Tito no Forum em Roma

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