sexta-feira, 28 de agosto de 2009

  • O PÓS CAPITALISMO DE PAULO PORTAS E MANUELA FERREIRA LEITE, OS NOVOS ESCRAVOS E A BUJARDA DE DAVID HOPFFER ALMADA.

Eleições. É ver os cartazes que andam por Lisboa e Portugal, contra aqueles que, passando por dificuldades económicas, vivem dos subsídios do Estado. É ver o CDS do Paulo Portas a gritar contra o povo subsídio dependente (toda a gente sabe do que fala, mas ninguém se atreve a dizer e a reconhecer que se trata de um discurso étnico e racialmente dirigido essencialmente contra aos ciganos e os mais pobres: um discurso racista e aporofóbico) e Manuela Ferreira Leite a seguir esse discurso com particularidades: acabar com os subsídios aos pobres para abaixar os impostos dos ricos. Pois claro: agora estamos em transição para o capitalismo pós capitalismo – os pobres que paguem a crise! – dizem os senhores da aristodemocracia politica e económica ou poliarquia em que vivemos.

No segundo quartel do Século III, havendo em Roma uma crise económica – que, como agora, já vinha de trás (desde a governação musculada do Imperium de Caracala a leviana de Eliogábalo, passando pelo condicionado de Macrino) – quem sofreu mais foi o povo e houve lugar a muita indigência, havendo então muito pobres envergonhados (pessoas antes prosperas e que a crise lançara nas ruas de Roma como indigentes). Ricos que, eles mesmos, se tinham lançado, muitos deles, no negócio da usura e fazendo concorrência a banca e tiveram problemas com os clientes – assim como a própria banca sofreu burlas «legais» que levou a que o Severo Alexandre proibisse a classe politica de se envolver nos negócios da bancários.

Mas as medidas imperiais foram mais longe: criou um sistema de apoio aos necessitados, mas havia quem não quisesse trabalhar; quem só pensasse em folgar. Severo Alexandre mandou proclamar em Roma que todos os que andassem na indigência fossem obrigados a trabalhar ou a aprender qualquer ofício; caso se recusassem a cumprir com a lei deveriam ser sujeitos à servidão – escravatura – sem necessidade de se recorrer a qualquer magistrado. Caso resistissem a ser escravos poderiam, legitimamente, ser mortos. Foi, certamente, uma forma draconiana de acabar com a indigência e, de acordo com a lei civil romana, sujeitar à servidão muitos que não tinham vontade ou eram incapazes de dirigir as suas vidas mas que não queriam morrer. Alguns países revolucionários contemporâneos (como a Cuba de Fidel e Raul Castro) têm leis análogas para a indigência – não são mortos, mas são presos, dai ser um país onde não se vêm mendigos ou pessoas confessando a sua fome (é o socialismo envergonhado).

Tenho a quase certeza de que Paulo Portas bem que desejaria aprovar uma lei dessas na Assembleia da República, e que o PSD de Manuela Ferreira Leite apoiaria tal medida legislativa – afinal, não foi ela que disse que se calhar o melhor era esqueceremos a democracia e termos a uma ditadura por seis meses (como faziam os romanos em tempo de crise)? Isso quer dizer uma coisa: suspender os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. O pior de tudo, e isso pode até parecer espantoso não o sendo, é que a maioria dos cidadãos apoiaria uma decisão de reduzir a escravidão quem não quisesse trabalhar. A teoria é arcana e a sua praxis política também: dá ao povo uma grande crise, alimenta-lhe o medo e poderás dispor da sua vontade e da sua liberdade.

E se sabem estas coisas – parecem conhecer a história da República Romana, pois fazem uma imitatio das suas políticas ou assim desejam… ao que dizem – porque não propõem uma Lei para acabar, como Severo Alexandre, com a promiscuidade entre o poder político e a banca? É que assim (i) deixaríamos de ter problemas como a da Sociedade Lusa de Negócios, o BPN, o Banco Insular e leis processuais civis e de custas judiciais para impedir o povo de aceder a Justiça (que, lembro, começaram o António Costa, o actual Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, como Ministro da Justiça…) e que beneficia a Banca, as grandes corporações, id est: os ricos e (ii) tornam o povo num exército virtualmente escravo da Banca – os cidadãos trabalham para, em grande parte, sustentar as instituições financeiras e não as suas famílias. Estamos perante uma nova forma de escravidão, de uma escravidão livre – «escravos de orelha furada», instituída por uma decisão de «livre necessidade», como diria Espinosa.

Esta aristodemocracia ou poliarquia em que vivemos – uma verdadeira nova monarquia sine nobilitas, vê o povo como um instrumento e não como o fim da política (e o bem-estar do povo é o fim de toda a polícia!). Basta vermos os políticos que, ao longo dos mandatos, enriqueceram de forma escandalosa enquanto o povo ficava cada vez mais dependente das instituições financeiras e sem capacidade de autodeterminação económica e financeira (e depois falam mal de África e/ou dos «mal governados»). Na política deve-se atar a boca do boi que debulha!, em todos os continentes, nos países «bem» e «mal» governados. E não é somente em Portugal que se quer um exército de dependentes (como novos Feudos ou Morgadios), em Cabo Verde também; por isso é que se ouvem coisas como as que se atribui ao deputado David Hoppfer Almada: de que há doutores a mais em Cabo Verde e que os filhos dos pobres deveriam ir para cursos profissionais (não creio, custa-me a crer!, que o possa ter dito no sentido em que foi veiculado – sendo certo que as palavras em si são, em qualquer sentido que sejam formuladas e tomadas, um non sense).

Mas isso, isso também não é coisa nova: Antonino Eliogábalo pensava de forma análoga e o que se atribui ao deputado David Hoppfer Almada e futuro candidato presidencial é a expressão verbal de uma prática social existente em Portugal e Cabo Verde há muito – a aristocracia académica (herdeira de práticas coloniais) e social criada e sustentada há muito (licenciados, mestres e doutores casam com licenciados, mestres e doutores; políticos com políticos; empresários com empresários ou com aqueles; os cristãos protestantes com cristãos protestantes – como ensina a doutrina cristã, e os sine titulum que sirvam de carne para canhão! Pois… que fiquem na fralda, e de fralda!). O Imperador Antonino Eliogábalo, certamente com um Hopffer Almada como assessor, pois já tinha exilado o jurista Ulpiano que não alinhava nestas coisas contra direitos fundamentais, legislou nesse sentido… Mas isso, isso fica para depois; para outras núpcias.

O poder económico, herdado ou adquirido, e a ciência de academia não podem nem devem servir como forma de opressão económica e de discriminação social – directa ou indirecta, deve servir, isso sim, para igualar o desigual (assim ensinava, e bem, Aristóteles à Nicómaco) e criar-se uma sociedade mais justa. E é por se assumir esta realidade desejada que um deputado do PAICV me disse, há uns anos, que o partido era/é um partido Social Democrata (!?). Pois será, neste sentido de Manuela Ferreira Leite e de Paulo Portas (que não da matriz política da social democracia emergente com o Estado Social de Weimar e que a República Federal da Alemanha é um dos bons exemplos) e a que José Sócrates não escapa e que se quer importar para Cabo Verde: um socialismo de gaveta, envergonhada, cega às necessidades e aos legítimos anseios dos mais pobres e ostensivamente elitista – a ter-se como certa as palavras de David Hopffer Almada – e em que os ricos são cada vez mais ricos e s pobres cada vez mais pobres e é necessário manter-se esse status quo no futuro. A economia e a educação são as formas pelas quais se controla um povo, uma sociedade; e não se pode ser inocente ao se contemplar acções e discursos dos dois lados do Atlântico.

É urgente repensar-se os conceitos de «Política» e «Democracia», e voltarmos aos sentidos etimológico e teleológico dos mesmos para se assentar no que é necessário: curar das necessidades de desenvolvimento global e estrutural do país e, em particular, dos mais pobres, fazendo com que sejam cada vez menos pobres – de bens materiais e de conhecimento – e assim construir-se uma sociedade mais coesa, próspera e solidária; é que assim, com esses discursos… assim não dá! O povo não agradece; pois «pove podê panhâ bidion, mas ka ê cego».

---- Prima forma: Liberal on line

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