quarta-feira, 12 de março de 2008


ELEIÇÕES AUTARQUICAS. A DEMOCRACIA E DEBATE DE IDEIAS

A democracia vive de ideias e projectos concretos com vista a alcançar o melhor nível de bem-estar dos cidadãos. Não é um sistema em que a lógica da coutada política ou do caciquismo deva ter lugar predominante.

Acontece que quer uma quer outra lógica (de coutada e/ou de cacique) sobrevivem quando as ideia são sacrificadas e o que importa é o nível de implantação dos interesses de um outro grupo político ou de uma outra individualidade.

Esta lógica é uma lógica antidemocrática pois vicia o «jogo» político e a vontade dos eleitores. Além de representar uma ideia de que o povo é «incapaz» de escolher bem que deva governar.

E porque arrazoo sobre esta questão, perguntar-me-ão. É que, no actual estádio da sociedade de pró desenvolvimento e de comunicação, não faz sentido que os candidatos às eleições autárquicas em Cabo Verde não venham a debater publicamente as suas propostas, com debates públicos e participação escrutinadora dos cidadãos eleitores.

Nas últimas eleições – quer presidenciais quer legislativas – o povo de Cabo Verde teve de votar sem saber, de forma clara, quem eram todos os candidatos (legislativas) em que votavam ou quem era o melhor homem (que poderia aferir através de debates públicos promovidos pela comunicação social) para o cargo presidencial.

Digo isso sem nenhum juízo de valor sobre os resultados eleitorais ou sobre os méritos de quem ganhou e/ou perdeu. Mas já emito um juízo de valor sobre a qualidade de uma democracia em que o debate público das ideias e dos projectos não tem lugar natural. E o juízo não pode ser senão o da mão escrevendo na parede: Mene Mene Tequel U Farsim – pesado foste na balança e achado fostes em falta.

A comunicação social de serviço público tem o dever de informar os cidadãos, nomeadamente sobre o exercício do seu dever cívico de votar e, acima de tudo, da dimensão da responsabilidade do poder de soberania que exerce no acto eleitoral. Este só é verdadeiramente poder se o cidadão for capaz de o exercer de forma livre e consciente; se não for assim, o mesmo é estéril e a sua passagem formal para os representantes eleitos não corresponderá à verdadeira vontade popular.

Será, assim, uma democracia de fachada – formal mas sem substância real.

Esse dever de informar da comunicação social, aliado (a) ao dever de informar e de sujeitar ao escrutínio público prévio as ideias e os projectos para as autarquias e (b) aos direitos dos cidadãos julgarem o que entenderem ser o melhor projecto social para a ilha onde vivem, demandam o confronto público dos cidadãos que desejam governar as ilhas.

O povo não somente merece com tem o direito de saber quais são os desígnios que movem os candidatos, de Santiago a Brava, passando por Santo Antão, S. Vicente, Fogo… Todos os ilhéus cabo-verdianos demandam um futuro melhor. Quem a oferece? Quem é capaz de concretizar os seus sonhos e anseios legítimos? Têm o direito de saber quem vem lá, quem é o Senhor(a) que se chegue e o que se propõe.

Não é conhecimento inato – como o sabe p´cagá – ou adquirido em razão dos nomes das pessoas, a sua popularidade ou o costume de ver o indivíduo no poder (princípio da inércia) que deve ser o norte e fundamento da decisão dos cidadãos: São as ideias, os projectos e a capacidade de realiza-las.

Sem debate, o povo é enganado – pois não faz a escolha certa e esclarecida, pois não tem todos os dados necessários para decidir o sentido do seu voto. É como o Primeiro Ministro decidir como gerir um dado dossier com informação deficiente. Sem debate as eleições são viciadas por natureza e a democracia é mero nomem cujos valores são, claramente, violadas.

Os cidadãos de um país não podem nem devem ser marionetas do teatro político – devem ser os julgadores do nível de bem-estar que os seus representantes são ou não são capazes de garantir.

Um povo esclarecido tem, certamente – como o demonstra a história mais recente da humanidade –, os melhores governantes e um nível de vida melhor. É, essencialmente, por esta razão que os países com cidadãos mais informados e conscientes do seu poder e capacidade eleitoral (fundamento do Estado republicano e democrático) têm alcançado os níveis de desenvolvimento social e económico nos últimos dois séculos.

Quem decide o destino do desenvolvimento de um povo não são os governantes – são os cidadãos eleitores. Quando os seus representantes falham, é o povo que o sente e sofre; merecidamente, pois quem falhou primeiro foi quem escolheu tais representantes e depositou neles o seu destino.

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