~ Vénus Adormecida, Giorgione (1510) ~
- LÍNGUA MATERNA
Quando todas as línguas nasceram
nos pés da Babel edificada por migrante
expurgado da verdade,
o seu ventre primeiro
era negro
– mater de mãe,
sarcófago de vinho iniciático,
maldição pós-dilúvio,
segredos; sim,
segredos como os que te afrontam
na hora primeira.
Negro, sim
negro era o proto-segundo
do universo logos parturiente
e hoje coração-ideia de Deus
quando sonhava companhia
e te via,
me via,
nos via
no saco amiótico do seu desejo…
Negro. Oh, sim…
Negro eram os rostos
– por determinação democrática –
que Agostinho via nas vias de Tagasta
e como me concebia nas fraldas de Mindelo
menino pé-descalço por vergonha
e feliz por não ser diferente.
Negro – Oh!, como os dias
são tão plenos de luz
vítrea, cortante, cega,
intranquila… – escuta;
mas fecha os olhos…
Negro – sim, negro
é também a cor da minha pele,
a alma da bainha do meu puro
adocicado de crepúsculo,
o teu leito de sins e ais,
a ausência de desejos nus
– teus, meus, de Deus
pois negro é, também,
o fechar dos olhos
e o início de ver.
Oh!, sim – disse-me a Aurora boreal –,
quando todas as línguas nasceram
a raíz era negra,
o ventre era negro,
o sonho era negro
e o filho chama-se ver,
ou será Nimrod?...
Virgílio Rodrigues Brandão
1 comentário:
Está lindo o poema Brandão!
Força aí!
Abraços!
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