terça-feira, 31 de agosto de 2010

  • MEMÓRIAS DA HISTÓRIA…
A OPAD-CV era uma organização de natureza política e cerceava a liberdade de pensamento e o livre desenvolvimento da personalidade das crianças cabo-verdianas.

Imagem: Aurelius Commodus, Marcia e Narcisus, o escravo grego que estrangulou o filho de Marco Aurélio Antonino.

  • MOMENTOS DA HISTÓRIA...
Crianças da mocidade portuguesa fazem a saudação nazi, importada da Juventude Italiana.

Imagem: Foto de Bernard Hoffman (Life Magazine, EUA)

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

  • O APONTADOR ÉTICO

A alma do apontador ético
é como a mais extraordinária das iguarias:
O seu destino é putrefacção,
cheirar mal.
A água de Caiszinho
não nasceu pura como a fonte do Tormes…
e as Messalinas do Intendente
não foram virgens como a pedra do Altar?

A alma do apontador ético
é uma mandrágora;
assim como o destino da larva
é ser borboleta,
o da pequena serpente ser dragão de sete almas
e o do espermatozóide gerir o Mundo.

A alma do apontador ético
vê tudo, sabe tudo, é parideira da verdade
e desmaia de saber
que a cegueira de saber é o pior dos venenos.

A alma do apontador ético
diz saber tudo, mas mesmo tudo! por si mesma
era um espermatozóide ético, de saco
com toda a verdade à venda em Sucupira
e no Bolhão de dias santos e véspera de julgamento.

A alma do apontador ético
não sabe o que sabe que eu sei: nada
é como vemos;
só é verdadeiro o que é invisível aos sentidos.

O apontador ético gere o Mundo
mas a mão que julga crucifica-o em silêncio…
----- […], 27-08-2010
Virgílio Brandão 

Imagem: O Cavalo de Calígula — Salvador Dali

  • A JUSTIÇA PRAGMÁTICA
Lia o Diário da República, e dou com esta: mais uma alteração — a décima nona — ao Código de Processo Penal Português… Reabriu-se, de novo, a porta à aplicação da prisão preventiva de forma quase discricionária. Quem foi que se esqueceu da lógica do Código em vigor e das políticas criminais subjacentes à mesma? Para se corrigir um erro de política criminal, repristina-se outro…

domingo, 29 de agosto de 2010

  • O MEU POETA
A beleza é análoga à divindade: Φ… a divina proporção. É, por isso, invisível aos olhos dos que não amam — diz-me o meu poeta.
Imagem: Aung San Suu Kyi

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

  • AGAPE

«Amei-te tanto, mas tanto
que depois de ti a minha alma fendeu-se
e incrustou-se ao meu coração
como as marcas das margens do ribeiro violento
que corre para alimentar a mãe.

Fiquei estragado para o amor,
fétido como uma couve podre à quinta-essência.
Desenraizado como pinheiro no deserto,
poupei toda a água do mundo
e todas as horas das madrugadas sem ti
até chegar onde não sei enterrar o teu nome,
o meu amor…
essa coisa funda, abissal
como a raia dos nove círculos de Dante
que enche cada recanto de mim...»
— dizia o bardo cego, sem olhos
arrancados à raiz de raivoso desejo
de não ver ninguém mais do que Ela...

Coxeia pelas bermas da vida
arrastando um caixão de rosas de inverno
com o nome dEla encriptado
pelas lágrimas inominadas que chorastes
nos meus olhos.

E tu? Nunca foste escandalizado pelo amor
que crucifica?
--- Lisboa, 26-08-2010
Virgílio Brandão
Imagem: Gallows-bird, Alexey Lobur


  • ELPIS
Quando chegar o dia puro
que o destino me sonha
não te construirei ruas de ouro, não;
elevarei um terraço de estrelas maduras
para mirarmos juntos pela tarde
do jardim do Jardim
as ilhas verdes dentro de nós.
--- Lisboa, 25-08-2010
Virgílio Brandão
Prima forma in Liberal

Imagem: Expectations, Lawrence Alma-Tadema (1885)

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

  • COBRANDO PROMESSAS…
Na ausência do Governo, pergunto: Mas quando é que a Isaura “Zau” Gomes concretizará a ideia de uma Orquestra Municipal? Imagine-se uma Academia da Música Cabo-verdiana a sustentar uma Orquestra com Chico Serra, Bau, Paulino Vieira, Mário Lúcio, Armando Tito, Toy Vieira, Tcheka, Voginha, Hernani Almeida, Princezito… como transmissores da cultura musical cabo-verdiana às novas gerações.

Imagem: Ornella Muti — Milo Manara

  • WORDS OF WISDOM
My people of Africa, we were created in the image of God, but men have made us think that we are chickens, and we still think we are, but we are eagles. Stretch forth your wings and fly! Don't be content with the food of Chickens — J.E. Kwegyir Aggrey

Imagem: Cavalaria de Aníbal Barak em Cannas

terça-feira, 24 de agosto de 2010

 
  • PISTIS SOPHIA

Quando eu for Deus
vou colocar o teu sorriso
como atavio de mil luas em Andrómeda
e fazer do perfeito belo.

Quando eu for Deus
e abolir a dor da memória
não sei como irei sofrer por ti…
mesmo quando estás presente, como agora
quando não te vejo no plenilúnio do meio dia
e és toda a minha ilha-berço.

Quando eu for Deus
vou fazer o que fiz antes da aurora
dos tempos: enamorar-me-ei de ti
e colocar-te-ei num jardim de supernovas
para começarmos tudo de novo;
e abolirei todos os desejos
que não sejam tu, eu e os frutos
das raízes fundas da luz que nos une.
---- Lisboa, 24-08-2010
Virgílio Brandão

Imagem: Aria Giovanni

  • PALABRAS DE SABIDURÍA
La manera más segura de mantener a un pueblo oprimido es educar a los varones y no ocuparse de las mujeres. Si se educa a un hombre, simplemente se educa a un individuo, pero si educa a una mujer se estará educando a una familia — J.E. Kwegyir Aggrey

Imagem: As Termas de Caracala — Lawrence Alma-Tadema

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

  • A BIGORNA DA LÓTUS

Ai! Se eu fosse o cemitério
dos pauis a minha alma não dançaria nos pessegueiros
à tua procura na morna.

Sou o humilde de raiz esmagada pela humildade
sem ti, ó poema do poente.
A contradança é o destino dos ribeiros
— queria poder dizer-te…
quando o corpo desperta na espera da tarde.

Posso nutrir o silêncio para sempre,
por toda a eternidade e até mesmo até amanhã;
o amanhã que é o verdadeiro Eterno…
mas quero que saibas
que o meu coração sangra raízes
e o mel dos teus beijos maduros
como se fosses a superfície frontal
de S. Nicolau com o tamanho do Mundo ausente
a cada alento que me sustem,
a cada pensamento que me move nas ruas basálticas
da tua ausência; a tua ausência…
Oh, céus! a tua ausência… faz do sonho tudo menos
que o teu sorriso em alvorada.
Sim; posso dar de mamar ao silêncio
mas é somente porque o medo me diz
— quando me escutas e és minha!, ó larva-poema —,
que tens o Big-Bang no aroma que me geme
como a lótus gerada na bigorna.
Lisboa, 23-08-2010
Virgílio Brandão


Imagem: Dark Labirint, Luis Royo

  • PALABRAS DE SABIDURÍA
La tensión inmanente al derecho entre facticidad y validez se manifiesta dentro de la administración de justicia como tensión entre el principio de seguridad jurídica y la pretensión de estar dictando decisiones correctas – Habermas.

Imagen: La pomme de la discorde – Jean Louis Grieg

sábado, 21 de agosto de 2010

  • AS CONSEQUÊNCIAS DO ESCÂNDALO
Ontem
retirei a trave que tinha nos olhos.
E vi.
Hoje, sou cego.
Lisboa, 21-08-2011
---- Virgílio Brandão

Imagem: Luiz Vaz de Camões

  • O ERRO DE CONSCIÊNCIA E EXPLORADA ATÉ À TANGA
Uma mulher trabalhou para um cidadão luso, durante três meses que este esteve de trabalho, mais férias que trabalho, em Cabo Verde. Pagou os dois primeiros meses de remuneração, e gastou todos os seus tostões nas noites do Mindelo. Voltou de socapa à Lusitánia. A empregada ficou a arder! E disse a si mesma, olhando para o Monte Cara: — Só as montanhas é que não se encontram…

Teve de emigrar, e foi à procura do homem em Lisboa. Queria o seu dinheiro, o fruto civil do seu trabalho. Era pouco, mas era seu.
— Não te conheço! — disse ele.
— Ah, não! Pagarás o meu suor, ó desalmado — volveu ela.

Procurou um Advogado, e disse-lhe:

— Dr., o cidadão Sicrano Malagueta e Tal deve-me a quantia de 14.000 Euros. Quero processá-lo, e todo o dinheiro que receber é seu, não quero nada; só receber o que é meu.
— Todo o dinheiro, Sra. Explorada Até À Tanga? – volveu o Advogado
— Sim, todo o dinheiro que receber será seu. Eu não quero nada, só que o Sicrano Malagueta e Tal me pague; pois não sou parva.

O Advogado acordou com ela, e resolveu patrociná-la; assumindo as despesas do processo. O problema era que a credora não tinha nenhum documento que provasse o seu crédito.

— Ele não é homem de dizer em Tribunal que não me deve, pois tenho testemunhas – afiançou ela. Assim sendo, o Advogado avançou para o Tribunal, reclamando o que era devido à Explorada Até À Tanga.

Na sua petição inicial a Autora dizia: com os fundamentos x, y e z… o cidadão Sicrano Malagueta e Tal deve-me a quantia de 14.000 Euros. O Réu Sicrano Malagueta e Tal, recebendo a citação, deduziu contestação (pois o silêncio equivale, em processo civil, à confissão de que os factos deduzidos pelo Autor são verdadeiros – mesmo que o não sejam!) e arrazoou: não corresponde à verdade o que a Autora, o cidadão Explorada Até À Tanga diz! Não devo 14.000 Euros, o que devo é 110 Euros por ter tido uma relação laboral com Explorada Até À Tanga e não lhe ter pago.

Ao ler a Contestação o Advogado chamou Explorada Até À Tanga ao seu escritório e, com a peça processual na mão perguntou-lhe:

— Pode me explicar o que é isto que o Réu Sicrano Malagueta e Tal diz?

Sim, posso! Se dissesse ao Sr. Doutor que o Malagueta me devia 110 Euros, nem me receberia. E nem teria hipóteses de receber o devido. Além, disso, o mafarrico do Malagueta teria vergonha de reconhecer, cara a cara em Tribunal que me pagava um ordenado tão irrisório. Mas para não pagar 14.000 Euros, reconheceria que me deve 120 euros.

O Advogado riu-se. «Mas como é que uma cidadã Explorada Até À Tanga sabe o que é o erro de consciência?» — pensará ainda hoje, pois não sabe que o povo tem toda a sabedoria de Deus. Mas há quem não saiba o que é a cominação plena — que funciona, no processo político, como no processo civil.

Imagem: Kiki Bokassa

  • VOZES DE ATENTAR
A era presente é uma era de anúncio ou de publicidade: nada acontece, mas há publicidade instantânea acerca disso – Kierkegaard.

Imagem: Frida Khalo

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

  • A REINVENÇÃO DO PARAÍSO

O Pseudo Areopagita sabia tanto,
mas tanto, que com o saber de Melquisedeque
visitou a segunda filha do paraíso.

E conheceu-a!
Nesse dia foi como Enoque na última andança.
Lembro-me de vê-lo rir-se mais
que toda a abóbada celeste de pão no Darfur.

Foi o primeiro a saber que o paraíso
era hímen, duro como chocolate em essência,
rubicundo! o campo rosáceo das entranhas de Adonai .

Orgíaco da palavra
nunca conheceu nela a palavra orgasmo,
até hoje.

Morreu, antes da reinvenção do paraíso.
Ele que sabia como se diz YHWH.
Ele que sabe como se diz o que és na noite escura.
Ele que saberá que ferrolhos terás no altar…
Lisboa, 20-08-2010
Virgílio Brandão

Imagem: Beso Arbolishvili

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

  • A REALIDADE NÃO ENGANA
Uma mãe solteira, em Cabo Verde, que ganhe 12.000$00 (140€)/mês, vive com o rendimento de 4,6€/dia. E há quem ganhe menos, muito menos! E o país, é de desenvolvimento médio! E há quem ache que o salário mínimo não é necessário! E depois não haverá de haver efeitos colaterais da miséria? Menos retórica, e mais acção!

  • ADEODATUS XXVII

Porque gritam os poetas
de pena resgatando as essências
e as lágrimas das mães de todos os Maios
se o bardo maior está silencioso
nas bandas do norte?

Nasci, e sonhava-me pescador.

Rasgado como bordas de rios broncos
tinha, antes de não ter-te,
todos os lugares de oiro de Almahumana
dançando ferida nas covas de Filipos,
o lugar da espera inesperada.

E do sul tenho tudo;
Céu que deixei de orelha furada
e oriente ventral,
o despertar do Ragnarök
que é onde estás à espera, paciente
como a terra verme.
---- Virgílio Brandão
Lisboa, 19-08-2011

Imagem: El abrazo de amor de El universo, la tierra - Frida Khalo

  • VOZES DE ATENTAR
O voto é o elemento da soberania; a representação, o meio de concentrar a vontade nacional para organização do poder público – José de Alencar.

Imagem: Vandalo (em Cartago), antes de serem derrotados no norte de África.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

  • QUEIJO E COMPAIXÃO
A minha mania de aprender uma coisa nova todos os dias coloca-me, por vezes, em dificuldades. Ontem aprendi a fazer queijo com a minha irmã, e requeijão com a minha mãe – como a sua mãe a ensinou em Santo Antão. Ensinaram-me, mas não me deixarão por isso em prática! Pelo menos com elas por perto. Hoje, meditando um pouco, pensava nisso. E lembrei-me das palavras de Aung San Suu Kyi sobre o ensino do budismo na sua pátria: «Precisamos de muita compaixão neste Mundo. Mas gostaria de ver o nosso povo a colocar em prática a compaixão.»

Há, assim, uma relação ética entre aprender a fazer queijo e requeijão e fazer queijo e requeijão; entre ter compaixão e por em prática a compaixão. Tenho compaixão por todos os que fazem o mal de forma gratuita, mas será que serei capaz de por a minha compaixão por eles em prática? É algo que tenho de aprender, um dia destes, a praticar com acções e não somente com omissões. Será um sonho adiado, como diz Langston Hughes? O certo é que hoje, hoje, tenho algo mais a aprender.

Imagem: Cipião Nasica, o Africano

  • VOZES DE ATENTAR...
Todo o Estado está fundado na violência – Trotsky aquando da assinatura do tratado de Brest-Litowsk.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Passo. E sou eu
Aquele que voo
Infinito.
--- Virgílio Brandão

Imagem: Deificação de Júlio César

  • ARTE POÉTICA

Que el verso sea como una llave
que abra mil puertas.
Una hoja cae; algo pasa volando;
cuanto miren los ojos creado sea,
y el alma del oyente quede temblando.

Inventa mundos nuevos y cuida tu palabra;
el adjetivo, cuando no da vida, mata.
Estamos en el ciclo de los nervios.
El músculo cuelga,
como recuerdo, en los museos;
mas no por eso tenemos menos fuerza :
el vigor verdadero reside en la cabeza.

Por qué cantáis la rosa, ¡oh Poetas!
hacedla florecer en el poema;
sólo para nosotros
viven todas las cosas bajo el Sol.

El poeta es un pequeño Dios.
--- Vicente Huidobro

Imagen: Amor y Muerte, George Frederick Watts

sábado, 14 de agosto de 2010


  • O MEU POETA
"O amor cura a cegueira humana" – diz-me o meu poeta.


  • EU E O MEU POETA
Saber mais, melhor ou diferente autoriza a criticar; de outro modo o silêncio é um dever, como não calar-se diante do mal – anoto ao meu poeta.

Imagem: in Dark labyrinth, Luis Royo

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

  • VANITAS VANITATUM
Começo do dia a pensar na morte, na sua inevitabilidade. Faz tanto sentido o connatus essendi… ou será que Kierkegaard e o Capitão Gancho têm razão? A final, neste aspecto, concordo com a evidência na voz de Christopher Hitchens: estamos a morrer, todos. E temos a ilusão de que vivemos, mas não; a cada momento consumimos a chama da vida. «Estou a viver» – dizemos. Mas não; não estamos a viver, estamos a morrer, lentamente. Somos o cancro do tempo que a eternidade nos empresta, como os talentos do Nazareno. E a única salvação é a apocatastasis singular do connatus essendi, o chegarmos para sermos eternos, transcendermos o nosso transporte…

Vanitas vanitatum omnia vanitas… o absurdo de Coélet ou a tragédia de Unanumo, tudo se resume à mesma essência, à mesma condição e situação de fragilidade perante o Devir — necessariamente Deus, "o que está acima de toda a mente e de toda a inteligência", nas palavras de Dionísio Aeropagita. E não é que os animais têm uma vantagem sobre parte considerável da humanidade? Enganam, mas não mentem. E mentir é roubar sentido à eternidade. A eternidade acabará por diferenciar-nos uns dos outros – e é trágico, (não) ter-se consciência disso. Mas isso diferencia, e é uma consolação possível. E Boechio concordaria comigo, hoje.

Imagem: Au-dessus du Monde, Vladimir Kush

  • A REALIDADE E A SOLTUTRA VERBORREICA EM CABO VERDE
Ouvindo responsáveis políticos em Cabo Verde a falarem, ontem, sobre a juventude, fiquei com uma dúvida instrumental: a realidade se engana ou está esquizofrénica? É que só pode! E, para piorar, há quem não consiga fazer o diagnóstico da realidade… e temos uma soltura verborreica de contornos incontroláveis, mas uma juventude que não se engana; uma juventude que quer mais, que sabe que merece mais e melhor.

O que me lembra a história de um homem que, há uns anos, foi ao médico – estava aflitíssimo! Chegando ao Hospital, contorcendo-se de dores, o médico perguntou-lhe:

— O que o Senhor tem?
— Oh, Senhor doutor! Tenho três males…
— Três males!?...
— Sim, Senhor doutor, sim…
— Ah, sim. E que males são? Pode me dizer?
— Oh, Senhor doutor! Tenho diarreia, soltura e caganeira.

O médico não resistiu, e deu uma gargalhada!, para embaraço do utente. Fez uma breve vistoria ao doente, passou-lhe uma receita e mando-lhe tomar os comprimidos prescritos três vezes por dia. O homem saiu do Hospital contente, esperançoso, pois o seu calvário de três males ia acabar. Passou na Farmácia Nena, na esquina da Rua de Lisboa, no Mindelo, e pediu ao empregado farmacêutico para aviar-lhe a receita e que lhe desse um copo com água pois queria tomar um dos comprimidos; ali mesmo.

Ao ver o copo com água e o comprimido o homem começou a chorar – para espanto do funcionário da farmácia que não percebia porque o cliente chorava e contorcia-se de dores e olhava para o comprimido com espanto: castanho esverdeado e com os ditos CIBA-GEIGY gravados. Antes de ir ao hospital já tinha auto-administrado, nas últimas 24 horas, vários comprimidos iguais, exactamente iguais… e acabava de gastar os seus últimos escudos neles.

Imagem: Terra, Milo Manara

  • NÃO ESQUECER...
A liberdade é a mais bela das coisas que a vida nos concede. Lembra-te de Aung San Suu Kyi... A sua luta deve ser também nossa.

  • POLIGRÁFICO
Às vezes dá mesmo vontade de fazer isso, não é Dilma?

Imagem: Dilma Vana Rousseff, provável próxima Presidente da República Federativa do Brasil.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

  • EU E O MEU POETA
O modelo de desenvolvimento do Governo do PAICV de José Maria Neves atraiçoou, pela segunda vez, os ideários de Amílcar Cabral — digo ao meu poeta.

  • EU E O MEU POETA
Mais belos que os lírios dos campos são os pássaros dos céus, pois têm asas — digo ao meu poeta.

Imagem: O Julgamento – Milo Manara

  • O MEU POETA
— Seu pudesse ter um único desejo na vida, imagina o que seria? — pergunta o meu poeta.
Sorri… e continuei a fumar, desejando não poder desejar nada; como o meu poeta.

Imagem: O Diabo de Milton, Rodin (1900)

O templo de Apolo, depois da erupção do Vesúvio.

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

  • EU E O MEU POETA
Quem morre na alma de alguém morre duas vezes; mas quem morre na memória colectiva morre para sempre – lembro ao meu poeta.

Imagem: O sacerdote – Milo Manara

  • AS LIBELINHAS E O IM DO IMPOSSÍVEL
Ontem vi um rato de quatro pernas. Pensava que os ratos estavam em vias de extinção, que tinham sido substituídos de vez pelos senhores do queijo. E fiquei espantado; eu que raramente me espanto. E lembrei-me de aconselhar o meu poeta:
— Os ratos, por vezes, retalham; e, outras ainda, roem devagar a carne dos adormecidos. E podem transmitir até mesmo a peste, a negra e outras de que são criadores.
Ó libelinhas, ó libelinhas… — anota o meu poeta; o meu poeta que anda com uma flor de lótus na alma que exibe às tardes enquanto a cidade ferve com ventos do Sheol e eu, eu pastoreio ratos da Lídia. Os ratos da Lídia, famintos, ainda não sabem que a natureza não é o im do impossível.

  • CONTRA LA SEDUCCIÓN

No os dejéis seducir:
no hay retorno alguno.
El día está a las puertas,
hay ya viento nocturno:
no vendrá otra mañana.

No os dejéis engañar
con que la vida es poco.
Bebedola a grandes tragos
porque no os bastará
cuando hayáis de perderla.

No os dejéis consolar.
Vuestro tiempo no es mucho.
El lodo, a los podridos.
La vida es lo más grande:
perderla es perder todo.
----- Bertolt Brecht

Imagen: Niklaus Manuel Deutsch - Enterpresing Death (1517)

terça-feira, 10 de agosto de 2010

  • EU E O MEU POETA
Deus está no ser amado, mas também nos que nos odeiam – lembro ao meu poeta.

Imagem: Mulher urinado, Rembrandt (pensa-se ser a mulher do artista) - 1631

  • DEL EGEO

El eros
El archipiélago
Y la proa de sus espumas
Y las gaviotas de sus sueños
En su más alto mástil el marinero ondea
Una canción.

El eros
Su canción
Y los horizontes de su viaje
Y el eco de su nostalgia
En su más mojada roca la prometida espera
Un barco.

El eros
Su barco
Y la despreocupación por sus nortes
Y el foque de su esperanza
En su más ligero oleaje una isla mece
La llegada.
---- Odiseus Elytis

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

  • WORDS OF WISDOM
"A practice condemned by the Constitution cannot be saved by historical acceptance and present convenience" – Supreme Court of the United States of America [U.S. v. Woodley].

Image: Andrej Rubljov

  • EU E O MEU POETA
O maior desafio de Cabo Verde é, ainda, o modelo de desenvolvimento; um povo não deve existir de mão estendida — digo ao meu poeta.

sábado, 7 de agosto de 2010

  • LO FATAL

Dichoso el árbol, que es apenas sensitivo,
y más la piedra dura porque ésa ya no siente,
pues no hay dolor más grande que el dolor de ser vivo
ni mayor pesadumbre que la vida consciente.
Ser, y no saber nada, y ser sin rumbo cierto,
y el temor de haber sido y un futuro terror...
¡Y el espanto seguro de estar mañana muerto,
y sufrir por la vida y por la sombra y por
lo que no conocemos y apenas sospechamos,
y la carne que tienta con sus frescos racimos,
y la tumba que aguarda con sus fúnebres ramos
y no saber adónde vamos,
ni de dónde venimos!...
----- Rubén Dario

Imagem: Coluna do Panteão, Roma

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

  • O DESENVOLVIMENTO MÉDIO
"Admito que há zonas que ficam mais de 17 dias sem receber água na rede. Estamos a fazer uma distribuição rotativa, com avisos para as pessoas poderem encher seus depósitos. A Electra não consegue atender às necessidades da população" – Hipólito Gomes, em representação da ELECTRA (Sobre a falta de água em S. Vicente).

----- Obviamente... diria o General Humberto Delgado, o sem medo.

  • A CEGUERIA POLÍTICA DE JOSÉ MARIA NEVES
Faz sentido que num país democrático o Presidente dos TACV proíba a distribuição de jornais nacionais na companhia de bandeira nacional porque estes – com ou sem razão, com ou sem justiça ao se pronunciarem sobre o mesmo nas suas edições – exercem o seu papel como órgãos de comunicação social? Não sabe o cidadão em causa que em democracia existem formas adequadas e legalmente reguladas para se reagir aos atentados contra a honra e a dignidade interna e externas das pessoas? Parece que não… ou então sabe e não acredita nelas, nas instituições da República; o que é mais grave ainda.

Há coisas que não fazem sentido, ou fazem demasiado sentido.

E faz ainda sentido pensar que o Primeiro Ministro ainda não tenha percebido e visto que o actual PCA da TACV (e o da ELECTRA!, v.g.), não vão lá?… Chegou a altura em que a responsabilidade deve(rá) ser aferida e assacada a quem manda, ao mais alto nível. Alguém tem de administrar colírio ao Primeiro Ministro José Maria Neves, pois teima em não ver (ou a não querer ver) demasiadas coisas que são uma evidência; e o povo não pode continuar a viver de promessas, e de utopias que os próximos tempos não permitirão concretizar sob pena de termos o país e o nosso futuro (ainda mais) hipotecado. O país real deve acordar! Antes que seja tarde, tarde para agarrar o futuro de bem-estar necessário.

A prova: Ouvi o debate sobre o Estado da Nação (o nome é eloquente!) na RCV, e parecia-me estar a escutar alguns dilectos discípulos do mestre Pangloss a falarem para o cândido cabo-verdiano como se o passado fosse o futuro. É possível um país melhor, sim! Mas não assim; não assim…

Depois de tanto e tão pouco para a realidade sonhada, esperada, exigida por cada poro do povo, de nós!, é hora de abrirmos os olhos, de dizermos: basta de brocardos e de enganos! É necessário continuarmos «a cultivar o nosso jardim.»

Imagem: Sleeping Putto, Perrault

  • GUANTE PERDIDO 

He aquí un guante negro de mujer.
Debe haber significado algo.
Un considerado extraño lo dejó
sobre el buzón rojo de la esquina.

Por tres días el cielo estuvo agitado,
luego, hoy día, cayeron algunos copos de nieve
sobre el guante que alguien,
en el intertanto, había dado vuelta,
de modo que sus dedos podían cerrarse

un poco... sin formar un puño todavía.
Yo, en tanto, esperé, con la noche que venía.
Algo me dijo que no me moviera.
Aquí donde las llamas se alzan de los tarros de basura,
y los sin casa duermen de pie.
----- Charles Simic

Imagem: Fassianos

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Un trozo de planeta por el que cruza errante la sombra de Caín.
Antonio Machado
  • TRISTE ESPAÑA DE CAÍN
¡Ay, triste España de Caín, la roja
de sangre hermana y por la bilis gualda,
muerdes porque no comes, y en la espalda
llevas carga de siglos de congoja!

Medra machorra envidia en mente floja
--te enseñó a no pensar Padre Ripalda—
rezagada y vacía está tu falda
e insulto el bien ajeno se te antoja

Democracia frailuna con regüeldo
de refectorio y ojo al chafarote,
¡viva la Virgen!, no hace falta bieldo.

Gobierno de alpargata y de capote,
timba, charada, a fin de mes el sueldo,
y apedrear al loco Don Quijote.
--- Miguel de Unamuno

Imagen: Escravo, Luis Royo