segunda-feira, 29 de setembro de 2008

  • O ALMOÇO DE CHEFES DE ESTADO DA CPLP EM NOVA IORQUE E O INVESTIMENTO DE CABO VERDE NO PORTUGUÊS COMO LINGUA OFICIAL DA ONU
Lá, de New York city, saiu uma «estratégia» para o português. A exigir, ao que parece, esforço financeiro considerável dos Estados membros da CPLP e, em Portugal, aplausos de causar dor nas mãos pois se descobriu, aparentemente de repente, a pólvora. É, parafraseando Vasco Santana, «palerma, Cândidos há muitos!»

Quero ver que meios financeiros o Estado de Cabo Verde vai (?) investir nesta campanha de promoção do português (que é a razão final da existência do «acordo ortográfico»), quando não investe nada na língua materna cabo-verdiana. Já alguém viu, nos últimos anos, alguma rubrica do Orçamento do Estado para esse fim estruturante? Se estiver enganado, corrigi-me, pois aceitá-lo-ei de bom grado e com a alma leve.

Como me diz amiúdas vezes um amigo (que não é a favor do acordo ortográfico, mas um cavaleiro andante do ALUPEC), ele não se importa(rá) que o acordo vá em frente, pois facilita a instauração do ALUPEC por causa das suas proximidades – coisa técnica por onde navegam.
É, como diz o povo, o encontro entre «a fome e a vontade de comer».

Mas, não deveria ser o Primeiro Ministro a assumir responsabilidades públicas sobre matérias que afectam o já parco Orçamento de Estado (OE) cabo-verdiano? O OE, pela estrutura social e económica do país, é – não raras vezes, para não dizer sempre – um «milagre» contínuo para satisfazer as necessidades básicas do país e a procurar lançar as bases de um desenvolvimento (e vamos lá esquecer os «relatórios» internacionais que não pão a ninguém mas somente servem para satisfazer os egos do a favor e do contra) sustentado mas que é, ainda, incipiente e a precisar de cuidados intensivos.

Na verdade, o Brasil tem imenso a ganhar com esta «estratégia» – com o português como língua oficial da ONU será mais fácil o país ser membro permanente da organização; facto que peca por se atrasar em demasia. Portugal conseguiria, assim, assim, entrar no seio da organização através do «império da língua». Lula da Silva e Cavaco Silva sabem o que fazem e podem sustentar (Portugal antevê um grande desenvolvimento económico depois de aumentar a sua plataforma continental (PC) e confirmar o que é praticamente uma certeza: a existência de Petróleo nessas águas da futura PC...

Mas, e Angola, Cabo Verde, Guiné Bissau, Moçambique, S. Tomé e Príncipe e Timor Leste? O que ganham, objectivamente, com isso? É bom que o Governo de Cabo Verde perceba que «não existem almoços grátis» – e isto é um ditado português, não cabo-verdiano.

Qual é a «estratégia» de Cabo Verde para a língua cabo-verdiana, o seu ensino, desenvolvimento e promoção nacional e internacional? Quem souber, que me diga! Sou amante da língua portuguesa, disso não haverá dúvidas; mas também sou amante da minha língua materna! Mas cada um «deve estender as pernas de acordo com o tamanho do seu lençol», bem dizia Rabindranath Tagore.

Não me parece aceitável que se venha a investir valores «de alguma dimensão» na língua oficial não materna quando (a) esta definha a olhos vistos, (b) não há dinheiro para a reforma da justiça e para cumprir com a Constituição, nomeadamente com a instauração do Tribunal Constitucional e o Provedor de Justiça, (c) os salários dos cabo-verdianos são cada vez mais desconformes à realidade e o custo real de vida e (d) faltam meios para garantir a segurança e a tranquilidade públicas, daí a necessária medida de trazer a policia militar para as ruas.

A ambição deve ser sustentada por quem a tem, mesmo que considere legítima (eventualmente necessária) essa busca de gradação internacional do português (o meio «acordo ortográfico» parece-me um meio desadequado mas enfim... é leite derramado nalguns sítios).
Apoiar essa iniciativa, sim! Dar dinheiro do escasso erário público para ela – quando não se investe na nossa língua materna nem no português a nível interno (com muita gente a sofre pobreza franciscana neste particular), não!

Não será admissível que se use dinheiros públicos para esse fim. O país tem e deve ter outras prioridades, ainda que, reitero, pudesse advir alguma utilidade desse fim. Aplaudo a ideia, mas o país não pode investir financeiramente nela. Cabo Verde tem e deve ter outras prioridades nessa área; não podemos vestir de púrpura a filha dos outros e deixar a nossa nua e deserta. Não! Não! – e Não!

Note-se que não mencionei a dimensão moral da questão... Nem é preciso. É que «não lembra ao Diabo» preocupar-se com o português como língua oficial da ONU e não se preocupar – e não agir nesse sentido! – com o cabo-verdiano como língua oficial no próprio país.

Eis uma bota bem apertada para o Primeiro Ministro José Maria Neves descalçar! Deverá estar a pensar: – «Não havia necessidade...» Ou então, o que seria e é natural, ter sido previamente informado pelo Presidente Pedro Pires dessa «estratégia», que não terá tido corpo na hora do almoço. Quem percebe um «niquinha» de politica e diplomacia sabe que as coisas não funcionam assim...

Nem eu, depois de a couple of Manhattans sweet straight up (coisa que os Presidentes da CPLP não beberam ao almoço, pois hora de trabalho é hora só de meter água...) algures nas margens do rio Hudson, faria pior. Cultivemos o nosso jardim, para depois podermos fazer o resto do Mundo florir, pois esse não nos cultiva como desejamos e sonhámos (mas será que, assim, merecemos?).
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Prima forma in Liberal on line
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  • Vénus adormecida, Giorgione (1510)

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