Tem sido longa a luta das mulheres contra um jugo antinatural que – segundo a tradição judaica e cristã – tem explicação (de ordem psicológica) no facto da mulher ter sido criada da «costela» de Adão. De espantar o nível de conhecimento de psicologia que o scriptore (Moisés) do Genesis tinha... Guardiãs dos arcanos segredos dos nefelins, foram expurgadas de uma posição activa na sociedade durante séculos, colocadas nas margens do saber pela inquisição, acusadas de bruxas e, durante muito, impedidas de aceder ao conhecimento pelo barbarismo social que é a desigualdade.
A razão mais evidente é simples: o homem sempre temeu o poder no feminino. Sempre que as mulheres alcançaram o poder foram tidas como bruxas – a causa era ou sua beleza de origem satánica, as pretensas práticas mágicas ou devassidão sexual ou moral. Exemplos acabados disso foram Ester na corte de Assuero, Ana Bolena com Enrique VIII, Cleópatra – a última raínha do Egipto, herdeira plotomaica e grande guardiã da Biblioteca de Alexandria – que é vista como a amante de Júlio César e de Marco Aurélio e não como uma grande estadista e intelectual (que é o que era, na verdade). Isso para não falar de Hatchepsut, Nefertiti, Júlia Maesa, Júlia Domna, Júlia Mammea ou até mesmo Faustina, Lucrécia Borgia ou Isabel I com quem a história não foi, não é, muita simpática; na verdade é injusta, muito injusta.
A mulher sempre teve e tem armas armas que os homens não têm – é um juízo (re)corrente entre os homens. Sim, é verdade! Mas não o dizem no sentido de elogio, mas com acinto. As capacidades inerentes à sua condição humana e de natural igualdade é desconsiderada amiúdas vezes – mesmo hoje, pois ainda restam resquícios do tempo em que a mulher era pouco mais do que uma incapaz ou um mero objecto sexual. Há 35 anos, v.g., ainda havia em Portugal (Metrópole e Ultramar) leis que permitiam ao homem tutelar a mulher e exercer o «poder de moderada correção» sobre ela – isto é: dar-lhe uma sova não escandalosa.
O próprio casamento, enquanto contrato, aparece como uma instituição para proteger a mulher da ganância dos homens; assim como aparecem as normas para as proteger do vitúperio. Não é por acaso que estas leis aparecem quando, na sombra, eram mulheres que tutelavam os jovens imperadores romanos. Mas esta opressão histórica, paradoxalmente, não diminuiu as capacidades das mulheres, pelo contrário: acicatou-as e hoje, cada vez mais, as mulheres tomam conciênca das suas capacidades e, por via do da democratização do conhecimento como forma de sustentar a ganância humana, a sociedade caminha, inexoralvelmente, para uma sociedade matriarcal.
O único perigo de uma sociedade matriarcal baseada no império do conhecimento é que ela, fatalmente, será destruída pela barbárie – o homem nunca cederá o poder que seja o seu espelho. É que, infelizmente, o poder tem o mesmo efeito corrompedor sobre as mulheres como tem sobre os homens, e a natureza sensível das mulheres não é bastante para vencer a do poder. De Lucrécia Borgia a Benazir Bhutto, passando por Julia Maesa (que sacrificou o próprio neto para se manter na sombra do poder) e Maria Spiridonova que sujeitaram ao imperativo do poder – by any means necessary, como diria Malcolm X.
Neste aspecto, Darwin e António Vieira têm toda a razão possível: os fracos perecem, os mais fortes sobrevivem; os grandes comem os pequenos. A força da razão acabará, infelizmente, cedendo à razão da força. Lamento este meu cepticismo, mas a realidade impele-me a tê-lo como certo. Espero estar sinceramente errado. Bom seria que fosse possível uma sociedade de conhecimento real, profundo e alicerçado na raiz da nossa humanidade mais primária e em que a diferença entre os géneros fosse vista não como diferenças de grau ou de qualidade, mas sim como manifestações do espírito humano. Ainda que, confesso, tenha para mim que não foi Adão que foi criado em primeiro lugar… mas Eva. Mas isso, é outra história.
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O homem sente-se ameaçado pelo feminino, e socialmente discriminado em determinados sectores da vida social. Conversas ocasionais, e até recorrentes com pessoas tidas como esclarecidas, levaram-me a esta conclusão. Mas é discurso em circuito fechado, raramente proposto ao feminino. Existem algumas excepções, como o fórum de discussão
Equality for Men que defende publicamente que, no actual estado das coisas, o homem está a ser discriminado e demandar proteção e um nivelamento igualitário da acção social. Interessante, e de atentar. Até porque não é um discurso estéril; longe disso.Imagem: Gustav Klimt, Die Musik
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