segunda-feira, 23 de junho de 2008

  • SALÁRIOS DE MISÉRIA E EMIGRAÇÃO
Como é que, num país de desenvolvimento médio, um funcionário de uma empresa de segurança pode receber 14.000 escudos por mês? E uma empregada de limpeza, 10.000 escudos? – perguntar-me-ão. Como é que, assim, se pode pensar em travar a pobreza e a emigração necessária – nomeadamente a ilegal?

As empregadas de limpeza, como as de uma empresa que se manifestaram hoje perante a Assembleia Nacional, vivem uma situação de exploração objectiva que urge por fim. Não é, em verdade, um problema do Governo – pois as empresas devem cumprir com a obrigação da remuneração justa do trabalho e o papel social que lhes incumbe – mas o executivo governamental pode e deve resolver este problema com uma regulamentação justa e adequada do quadro salarial nacional.

A inexistência de um salário mínimo nacional e de remunerações dignas são das causas maiores da pobreza estrutural, logo da emigração. Não se pode falar de desenvolvimento se os salários reais não crescem, se o povo não vive melhor, se não tem dinheiro suficiente para cumprir com as suas obrigações mais básica e de forma condigna – isso a despeito do trabalho.

Espero para ver qual é o conteúdo do acordo sobre e(i)migração que Cabo Verde e a França estão a negociar. A França é a nação europeia que – juntamente com a Itália – tem a perspectiva mais restritiva da imigração. Uma coisa é certa: basta de acordos de e(i)migração e trabalho sazonais, uma espécie de reserva de mão de obra descartável para os países ricos.

Um país como Cabo Verde – no actual contexto das políticas migratórias e de segurança da União Europeia – deve pedir mais aos seus parceiros de desenvolvimento europeus, em particular os que são destinos finais da emigração cabo-verdiana e que pedem ao país para ser a sua guarda avançada no combate à imigração ilegal e ao tráfico transnacional de pessoas e estupefacientes.

O sonho do migrante internacional é incompatível com o trabalho sazonal.

As pessoas não emigram para ganhar meia dúzias de tostões e voltar, não; emigram para encontrar uma vida melhor. O trabalho sazonal não permite isso, só uma parte ganha com isso: o país de acolhimento da mão-de-obra do trabalhador; o que se acolhe é a mão-de-obra, não o trabalhador. Se este tivesse acolhimento era imigrante com papéis, não «ilegal» ou «sem papel».

Há alguns anos ouvi uma assessora de um Secretário de Estado da Administração Interna em Portugal dizer (in Galeto veritas, diria – pois o local é propício a fazer as pessoas dizerem o que pensam e não o que veiculam para o povo) que «o perigo é que legalizar um implica legalizar a mulher, os filhos... um dia destes temos cá toda a gente.» Pois é..., ainda acabamos por estragar a «raça», dirão alguns.

O que a falta de um salário digno faz uma pessoa suportar...
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  • Imagem: Pablo Picasso, Young woman

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