- A PARTICIPAÇÃO DO PRIMEIRO MINISTRO NOS DEBATES DA ASSEMBLEIA NACIONAL
Segui, através da RCV o debate na Assembleia Nacional, sem a presença do Primeiro Ministro. Insistiu-se demasiado na questão dos transportes – sem grande interesse dialéctico – e na poesia das promessas e dos discursos políticos.
O deputado Humberto Cardoso levantou uma questão pertinente na Assembleia Nacional – ainda que, estranhamente, não a tenha sabido defender – e que é a da violação da Constituição com a ausência reiterada do Primeiro Ministro no Parlamento nacional.
Segundo o mesmo, o chefe do Governo não vai ao Parlamento desde Novembro e a Constituição obriga a que se «apresente regularmente» para debate com os parlamentares.
Invocou o Artigo 155º (Participação do Governo). Diz esta norma:
1.O Primeiro Ministro deve apresentar-se, regularmente, perante o plenário da Assembleia Nacional para debate de interesse público e actual e nos demais casos previstos no Regimento da Assembleia Nacional.
2.O Governo tem o direito de comparecer às reuniões plenárias da Assembleia Nacional, podendo usar da palavra, nos termos regimentais.
3.Poderão ser marcadas reuniões para interpelação do Governo, para formulação de perguntas orais ou escritas ou para pedidos de esclarecimentos, nas quais é obrigatória a presença do membro ou membros do Governo convocados, podendo, contudo, o Primeiro Ministro ser substituído por um dos Vice-Primeiros Ministros ou por um Ministro e os Ministros por Secretários de Estado.
4.Os membros do Governo podem solicitar a sua participação nos trabalhos das Comissões e devem comparecer perante as mesmas, quando tal seja requerido.
A norma não deixa margem para dúvidas. A Ministra dos Transportes disse que o Primeiro Ministro «tem vindo com bastante regularidade» ao Parlamento e que o «Governo tem estado representado no Parlamento»...
Não aparecer em oitos meses no Parlamento é regularidade? Com que critério? Era só o que faltava: o Governo não ser representado em debates no Parlamento.
O Presidente da Assembleia Nacional – cujo embaraço se percebeu à distância das ondas hertzianas – percebeu a relevância da questão e remeteu a sua solução para a revisão do Regimento da Assembleia Nacional. No seu entender deve-se proceder à uma revisão do Regimento para clarificar os termos dos debates com o Primeiro Ministro.
Não é assim, de todo. Essa obrigação é estruturante num sistema democrático – e se o Regimento não o prevê expressamente, deve-se, por analogia, aplicar as regras para os debates com o Governo. A ausência do Primeiro Ministro, de forma reiterada, é que é um atentado à democracia nacional.
Uma coisa é certa, a Constituição exige uma presença do Primeiro Ministro nos debates, independentemente do que diz o Regimento – é o que diz a Constituição no Artº.155º., nº.1. Por isso é que existe uma conjunção coordenada copulativa nesta mesma norma...
Agora, pode-se fazer uma fuga para a frente (como fez o Presidente da Assembleia Nacional), mas nunca dizer como disse a Ministra – que não deve ter lido a Constituição nesse momento – em resposta ao argumento do deputado Humberto Cardoso, de que «não concordo com a leitura que a Constituição assim impõe».
É uma imposição constitucional, é um deve e não um pode; o que faz uma diferença substancial. Não é matéria susceptível de opinião, como muitas outras – como o isolamento estrutural de muitas lhas, a gestão das empresas do Estado ou a justiça ou não da taxa rodoviária (com que, na generalidade, estou de acordo desde que afecta ao fim específico da sua criação).
Não consegui, por motivos profissionais, seguir a sessão da tarde, espero que tenha sido mais interessante e com mais substância.
- Foto: Mindelo, S. Vicente. © Nuno Pombo Costa
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