segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

  • PRIMA IUSTITIA
Pedro Pires, Presidente da República, nomeou a Magistrada judicial Zaida Lima para o Supremo Tribunal de Justiça. Tudo bem, tudo normal. Não fossem duas ou três coisinhas. A Constituição diz-nos que para o cargo devem ser nomeados juristas nacionais (não necessariamente magistrados) de «mérito»; critério enunciado que é concretizado no Estatuto dos Magistrados Judiciais que diz que devem ser juristas de «mérito reconhecido».

É que a Magistrada em causa, peso os seus méritos pessoais, não se encaixará naquilo que será a exigência legal e constitucional; ainda que se esteja – como muitos dirão – perante um conceito vago e indeterminado. Não é o caso, de todo; mas isso não vem à colação de momento. É que, salvo melhor opinião, ter 33 anos, ser-se Magistrado de 2ª. classe com 8 (oito) anos de actividade forense não é, nem de perto nem de longe, factos bastantes de serem integrados no conceito de «mérito» e muito menos de «mérito reconhecido». Mas, além desse facto, não conheço nenhum outro facto (existirão, certamente, mas eu não os conheço) para sustentar a decisão do Presidente Pedro Pires.

Note-se que esta nomeação não é, de todo, um acto discricionário (escolher quem quer, «sem dar cavaco a ninguém») do Presidente da República – é, pelo contrário, um acto vinculado aos critérios legais. Mas o que fazer? Estamos num país em que a sindicância de actos dos titulares de órgãos de soberania não é, de todo, uma tradição jurídica. Tem sido, de todo, a terra do «tchá bai».

Agora, dois factos ensombram esta nomeação: o facto da Dra. Zaida Lima ser prima do Comandante Pedro Pires e o irmão da Magistrada eleita ser assessor do Presidente da República (segundo informação que detenho). Estes factos, sem qualquer sombra de acinto, levantam sérias suspeições sobre a nomeação presidencial. As capacidades técnicas, pessoais e humanas (exigidas a um Magistrado judicial) da nomeada não estão – nem devem estar – em causa. O que deve estar em causa são os critérios objectivos da lei: saber se a decisão é feita nos termos da lei ou se a mesma não foi respeitada – isso para além do plano ético da questão. Saber se a questão do «mérito» foi respeitada, ou não; eis a questão. «A mulher de César…», já dizia Marco Aurélio…
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Não sou, já o disse, contra a nomeação política de Magistrados para os tribunais superiores; bem pelo contrário: entendo que tal facto legitima democraticamente a função jurisdicional (donde emerge a legitimidade democrática dos Tribunais?). Agora, a forma como é feita é que não me parece a mais correcta e – como se verificou – a mais transparente. Sou a favor de nomeação política, sim… mas sujeito a um estreito crivo parlamentar, a fim de se aferir (a) algumas qualidades dos magistrados e (b) a sua esfera de interesses; à imagem do que acontece nos Estados Unidos da América (sistema que tem os seus defeitos endógenos, mas tem este aspecto virtuoso).

A transparência não pode ser um discurso; tem de ser uma realidade. Se, mesmo agindo com a maior transparência e probidade estamos sujeitos à maldade, à maledicência e à injustiça… por maioria de razão, a menor das falhas coloca em causa o bem que transportamos. Mais: fere a imagem ou a honra externa de quem não é culpada de servir e desejar servir o bem comum.
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Uma coisa é certa: 8 anos de exercício da magistratura judicial não qualifica ninguém a ser Juiz Conselheiro no Supremo Tribunal de Justiça – a não ser que se seja um jurista de excepção. Mas a situação não é inédita no país. Prima Iustitia (a Justiça primeiro).

1 comentário:

Anónimo disse...

VB, o conceito de mérito deve ser aferido na realidade sociológica do país em concreto.
Concordo que a questão do mérito passa pelo superar o cumprimento escrupuloso dos deveres profissionais. Mas o mérito em Cabo Verde não será neste momento actual de grandes desafios de desenvolvimento, e nomeadamente na judicatura, exercer, por exemplo, com rigor, isenção, sem receios, imparcialidade, com sentido de justiça, os poderes que a lei e a CRCV conferem aos magistrados crioulos?
Pergunto, apenas VB.
Agora o importante que se dê esses sinais à sociedade e que possamos gradualmente superar-nos.
Inté
:~)