sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

  • FISHING FOR CRITICS
No outro ia falava com José Luís Hopffer Almada e dizia-me ele – a propósito de uma obra poética em particular – que na infância jaz a um manancial de inspiração poética. Não pude deixar de, em parte, concordar com ele. E, pela mesma altura, vi parte de uma conversa de António Lobo Antunes com Paul Holdengräber no New York Public Library. Dizia Lobo Antunes, com alguma – bem, na verdade muita – jactância:

«Quando se pergunta a um escritor sobre as suas influências fala de grandes nomes, não é verdade, mentem o tempo todo. Eu comecei a ler por causa do Flash Gordon, do rato Mickey… coisas que lia quando tinha 5 anos de idade, eram livros importantes para mim… Sandokan, do Captain Blue. Comecei a escrever por causa deles, por isso não me preocupo com o Homero».

Sim, é normal que tenha gostado de Flash Gordon, do universo Disney e dos dc comicsMas quem é que não se apaixonou por eles na infância, não aprendeu a ler e a deixar a imaginação voar com eles? Isso é, de todo, um lugar comum partilhado por gerações. Agora, a ideia de que não gostará de Homero ou que a sua reconhecida influência é uma mentira constitui, de todo, uma falácia alimentada pelo ego que se sente sombra, pois leu-o e, certamente, terá, no mínimo, gostado da Odisseia e a da Ilíada; ou odiado os mesmos – como a maioria faz com os Lusíadas… até o entenderem. Menino é que não os terá lido nem entendido. Enfim…

Imagine-se o que se diz dos cidadãos comuns que não conhecem os Lusíadas: são logo apodados de iletrados, de incultos. Mas sabe(rá) o novo culto homem assinalar a hora da adequada da poda e das marés, fazer pão ou travar uma enxada com a terra? Claro… Homero não importa; depois de passar-se a Taprobana dos aplausos ganha-se áurea de deus do Olimpo literário e, para afirmar-se grande, autonomiza-se da grandeza. Necessário? Para algumas almas, parece que sim; viver a eternidade antes de chegar é bem capaz de ser um orgasmo de alma; sim, é bem muito provável.

A verdade é que há tempo para tudo; até para crescer. Há alguns anos dei um conselho à uma pessoa e, depois, tomei-o para mim: «No que toca à criação, não deves mostrar a quem pedes uma opinião o teu melhor; pelo contrário, mostra todas tuas imperfeições – se o fizeres verás que serás criticado e com isso crescerás e poderás ser e fazer melhor. Se mostrares o teu melhor, o teu ego nunca te deixará ver as tuas imperfeições». Se é útil? Não sei… tudo me parece, assim, demasiado imperfeito; sempre demasiado imperfeito.

Não deixei a minha infância enterrada na terra mindelense nem nas calçadas de Lisboa, não. Anda comigo, passeamos de mãos dadas de vez em quando e, dias há em que me diz que devo atentar nas suas necessidades. Então, faço isso mesmo. Sim, o manancial da minha infância não é de inspiração poética; é de mais, muito mais.

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