quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

  • D. JOSÉ POLICARPO E O CASAMENTO DE CRISTÃOS COM MUÇULMANOS

Não percebo, sinceramente, a surpresa com que a sociedade portuguesa – acicatada pelos media – viu na semana que passou as declarações de D. José Policarpo, Cardeal Patriarca de Lisboa. O homem sabe o que diz – ao contrário de quem o criticou que não quer saber da essência do que critica.

Como é que um povo se pode dizer cristão sem saber o que a sua religião ensina? Como é que uma sociedade pode criticar um facto social se não sabe o que se passa no interior da sua sociedade, não está atento às problemáticas que o casamento inter-religioso, no actual contexto social planetário implica? O que o Cardeal Patriarca de Lisboa disse é o que a Igreja defende há dois mil anos – S. Paulo diz claramente que os cristãos não devem casar com «um jugo desigual», o que é dizer com ão cristãos. É a doutrina da Igreja cristã desde sempre, daí se exigir na igreja católica o baptismo e nas protestantes evangélicas a conversão. Nesta casar-se com pessoas «do Mundo» é pecado extraordinário.

O islamismo e o judaísmo também pensam e ensinam a mesma coisa – no judaísmo é-se, ainda, mais severo: judeu casa com judeu sob pena se exclusão da comunidade religiosa e social. É o que se ensina, entre portas. Dizer isso publicamente, não – é pecado. Pecado de sinceridade.

Mas D. José Policarpo quis ir mais longe (e já nem penso nos problemas legais e judiciais que esta questão tem levantado no país – nomeadamente com os «casamentos brancos» ou de «conveniência»), quis chamar a atenção para o facto de que existem planos do chamado diálogo inter-religioso em que o diálogo é impossível pois para haver diálogo há que haver transacção e o islão, o judaísmo e o cristianismo não são, de todo, permeáveis a esta ideia.

A intransigência dos princípios basilares destas religiões não permitem, nem nunca permitirão, quaisquer tipos de diálogos profícuos. O diálogo inter-religioso é uma falácia se o que se quer é que todas as religiões falem a mesma linguagem social ou religiosa para a construção de uma sociedade global melhor e mais solidária. Tal não é possível, pois estas religiões têm visões e/ou projectos de Mundo substancialmente diferentes.

Mesmo no pano da convergência de pontos de vista para a criação de uma Civilização do Amor – ideia emergente do Consílio Vaticano II –, que é/seria de almejar por todos, a divergência é patente. Não vale a pena fingir-se que existe diálogo onde não existe e não é possível, nem se deve ter medo, como bem diz D. José Policarpo, do confronto – sim, do confronto de ideias e de perspectiva sobre o futuro da humanidade.

Bastará lembrar as perseguições aos cristãos em Jerusalém e em todo o Israel na emergência do cristianismo, «a guerra santa» e as suas causas, a perseguição aos judeus na Europa, a inquisição, as causas profundas do conflito israelo-palestiniano, etc. As afirmações contundentes de que «só Alá é Deus e Maomé o seu profeta» e «que eu sou o caminho, a verdade e a vida, ninguém vem ao pai senão por mim» são, por si mesmas, condicionadoras de todo e qualquer diálogo que se possa chamar como tal.

A história é eloquente e, todos os dias, mata qualquer forma de diálogo entre agentes que se excluem uns aos outros no plano dos princípios e da teleologia da acção. Terão, sim, um inimigo comum: a negação de Deus. Mas, paradoxalmente, é um homem que não é religioso, Mário Soares, que preside a entidade responsável em Portugal para a promoção do diálogo inter-religioso. O que, por si só, é prova bastante de que um inimigo comum não basta para haver diálogo. A humanidade avançará mais com o confronto de ideias e de ponto de vistas – sobre Deus e sobre tudo – do que com a aparência de dialogo que, em si mesmo, não esclarece nada e deixa tudo, necessariamente, na mesma.

Quer se queria quer não, o Mundo há muito que se encontra perante um conflito civilizacional – à laia de paninhos quentes e de uma falácia de diálogo –, tem-se feito de tudo para não a encarar de frente e sem rodeios. O medo, de todo, nunca foi um bom conselheiro.

Ouça as declarações do D. José Policarpo:
http://tsf.sapo.pt/paginainicial/vida/interior.aspx?content_id=1071469
.

  • Imagem: Salvador Dali, Arab,1962

Sem comentários: