A cada dia cresce o número de pessoas – mulheres – que engrossam a já enorme população prisional cabo-verdiana (brasileira, colombiana) pelo Mundo fora por causa do tráfico de droga.
Nunca, mas nunca encontrei, até hoje, um homem a fazer de correio da droga que não estivesse consciente da sua acção (ainda que, mesmo para o Advogado que o defende, sempre diga que não sabia) e somente um não era movido pela ambição mas pela necessidade desesperada.
No que diz respeito às mulheres... às chamadas «mulas», porque servem transporte de droga, são, em regra, movidas pela necessidade. Mas essa expressão «mula», parece-me ter um outro sentido, bem mais óbvio: são mulas o género feminino do burro; sim, são, também, burrinhas que, a maioria das vezes, acabam na cova dos leões sem a sorte de Daniel, pois são – quase sempre – abandonadas à sua sorte, sofrendo o cárcere e com as famílias ameaçadas pelos traficantes.
E quem não troca o seu silêncio pela vida do filho, dos pais, do irmão ou qualquer outro ser amado? A decisão é óbvia, uma livre necessidade - como diria Espinosa. Essas mulheres, não raras vez, estão perante um dilema análogo ao dilema do Burro de Buridan que, após uma longa travessia pelo deserto chegou, sedento e faminto (Aristóteles, numa perspectiva da ética, narra uma história análoga), a um destino onde encontrou dois fardos de feno equidistantes entre si em relação ao local onde estava parado. Pasmado, ficou a pensar no que deveria fazer primeiro; se comer do belíssimo e delicioso monte de feno que estava à sua esquerda a convidá-lo a banquetear-se ou se deveria comer da outra que, nas mesmas circunstâncias, estava à sua direita a tentar a sua vontade. Enquanto se decidia, morreu de fome.
Estas mulheres, em regra, estão perante o infortúnio extremo e certo e o infortúnio extremo e incerto. Se escolhem uma coisa, é a desgraça; se outra, é a desgraça possível. Os traficantes, não conhecendo o dilema do Burro de Buridan, sabem o que é a necessidade e andam, com afã, à caça dessas mulheres (conseguem, inclusive, informações de instituições bancárias sobre a situação difícil das mesmas – não me perguntem como, pois não sei nem devo saber) para atravessar o deserto por eles. Isso quando não recorrem às namoradas de conveniência ou amigas de circunstância para a viagem.
A cenoura mais comum é a promessa de pagar a «conta desesperada» que, em regra, as afronta. Estas mulheres, falhas em usar a razão – é certo, são vítimas e não, verdadeiramente, criminosas; algumas em verdadeiro estado de necessidade desculpante. Mas, como dar-lhes um tratamento verdadeiramente diferenciado no quadro do problema social que é o tráfico de estupefacientes sem prescindir de uma politica de prevenção geral do crime efectivo?
Este é, sem dúvida, um dos grandes desafios sociais que è lançado aos legisladores e aos juízes; estes até que têem uma percepção casuística deste problema, aqueles, claramente, ignoram-no. Não estarão os legisladores, eles mesmos, perante o dilema do Burro de Buridan? Na verdade, do «Homem Indeciso» de Aristóteles (propõe a escolha entre dois bens fundamentais – comida e bebida – à imagem de um conflito de direitos fundamentais). É que se não é, parece. E, enquanto não escolhem, alguém, algures, sofre sevícias e morre por causa disso; da omissão de encontrar-se uma solução adequada.
Nunca, mas nunca encontrei, até hoje, um homem a fazer de correio da droga que não estivesse consciente da sua acção (ainda que, mesmo para o Advogado que o defende, sempre diga que não sabia) e somente um não era movido pela ambição mas pela necessidade desesperada.
No que diz respeito às mulheres... às chamadas «mulas», porque servem transporte de droga, são, em regra, movidas pela necessidade. Mas essa expressão «mula», parece-me ter um outro sentido, bem mais óbvio: são mulas o género feminino do burro; sim, são, também, burrinhas que, a maioria das vezes, acabam na cova dos leões sem a sorte de Daniel, pois são – quase sempre – abandonadas à sua sorte, sofrendo o cárcere e com as famílias ameaçadas pelos traficantes.
E quem não troca o seu silêncio pela vida do filho, dos pais, do irmão ou qualquer outro ser amado? A decisão é óbvia, uma livre necessidade - como diria Espinosa. Essas mulheres, não raras vez, estão perante um dilema análogo ao dilema do Burro de Buridan que, após uma longa travessia pelo deserto chegou, sedento e faminto (Aristóteles, numa perspectiva da ética, narra uma história análoga), a um destino onde encontrou dois fardos de feno equidistantes entre si em relação ao local onde estava parado. Pasmado, ficou a pensar no que deveria fazer primeiro; se comer do belíssimo e delicioso monte de feno que estava à sua esquerda a convidá-lo a banquetear-se ou se deveria comer da outra que, nas mesmas circunstâncias, estava à sua direita a tentar a sua vontade. Enquanto se decidia, morreu de fome.
Estas mulheres, em regra, estão perante o infortúnio extremo e certo e o infortúnio extremo e incerto. Se escolhem uma coisa, é a desgraça; se outra, é a desgraça possível. Os traficantes, não conhecendo o dilema do Burro de Buridan, sabem o que é a necessidade e andam, com afã, à caça dessas mulheres (conseguem, inclusive, informações de instituições bancárias sobre a situação difícil das mesmas – não me perguntem como, pois não sei nem devo saber) para atravessar o deserto por eles. Isso quando não recorrem às namoradas de conveniência ou amigas de circunstância para a viagem.
A cenoura mais comum é a promessa de pagar a «conta desesperada» que, em regra, as afronta. Estas mulheres, falhas em usar a razão – é certo, são vítimas e não, verdadeiramente, criminosas; algumas em verdadeiro estado de necessidade desculpante. Mas, como dar-lhes um tratamento verdadeiramente diferenciado no quadro do problema social que é o tráfico de estupefacientes sem prescindir de uma politica de prevenção geral do crime efectivo?
Este é, sem dúvida, um dos grandes desafios sociais que è lançado aos legisladores e aos juízes; estes até que têem uma percepção casuística deste problema, aqueles, claramente, ignoram-no. Não estarão os legisladores, eles mesmos, perante o dilema do Burro de Buridan? Na verdade, do «Homem Indeciso» de Aristóteles (propõe a escolha entre dois bens fundamentais – comida e bebida – à imagem de um conflito de direitos fundamentais). É que se não é, parece. E, enquanto não escolhem, alguém, algures, sofre sevícias e morre por causa disso; da omissão de encontrar-se uma solução adequada.
- O burro que está aí é o de Buridan... ou será o de Aristóteles?...
4 comentários:
Este está realmente bem apanhado.
Nós estamos equidistantes do dilema: fazer um discurso pró-investimento e pró-negócios a qualquer jeito, com o intuito de ultrapassar no imediato as nossas angústias materiais de sobrevivência; ou fazer um discurso da solidariedade social, dos valores humanos, do emprego, da diminuição da pobreza, da educação e da Cultura. A verdade é que não conseguimos decidir (ou assumir) um ou outro e nesse meio, há tipos que estão se aproveitando à grande.
Tudo faz parte de discursos coerente. Eu, que defendo os valores sociais acima de de tudo, aceito os investimentos e os negócios, desde que sejam efectivamente uma forma de termos recursos, para combatermos os problemas da pobreza e da educação, que estão na base dessas terríveis consequência, como o tráfico "necessário" de drogas.
Texto com bianda este! Gostei.
César,
a pobreza é a culpada, diremos. Mas não cabe ao Estado acabar com a pobreza, quer material quer de valores?
Há um facto curioso: sempre que defendo (eu e a maioria dos meus colegas) um pequeno traficante e - escapando à prisão peventiva - o mesmo viaja para Cabo Verde...
As leis sobre o branqueamento de capitais e normas do género não são, de facto, aplicados no país. O tráfico é, infelizmente, uma fonte indirecta de rendimentos para o Estado e a estrutura social no seu todo.
No meio disso tudo, abundam as vítimas. É que a pobreza tem outros contornos.
No outro dia vi o programa de Abraão Vicente sobre a alimentação e gostei de ver o que o Governo faz nas escolas pelas crianças menos favorecidas.
Agora, não gostei de ver as crianças expostas da forma como foram. Achei, sinceramente, um atentado à dignidade das mesmas. A pobreza não, de todo, espectáculo de e para ninguém.
É possível fazer o bem sem tornar isso espectáculo, não é? Mais uma vez a comunicação social? Não me parece, pois ninguém (que eu saiba) se mostrou indignado com esse facto.
Por acharem «normal»? A indignidade nunca é normal; só o é quando...
Às vezes, sem saber(em), as pessoas são «marcadas» socialmente e para outras coisas. Temos de aprender a ver para além do óbvio; mas, sobre tudo, dignificar as pessoas, mesmo quando as ajudamos.
Abraço fraterno
Este assunto das mulas cv nao parece interessar muita gente pela poucas reaçoes exprimidas neste blog e nos jornais online. Nao interessa a pobreza das raias miudas, esta nao é "politiquement correct" em CV!! Sim todos os esforços se concentram numa comunicaçao de "façade" a moda dos amigos da onça ocidentais que ganham eleiçoes com mentiras e chorudas dividas de campanha. Para quê, para quem?!! O pior em tudo isso é a hipocrisia ou a incompetência condenavel do consul em Sao Paulo que declara aos jornais nao estar la para proteger estas cidadas cv. Nao deve entao conhecer as convençoes diplomaticas e consulares internacionais, nao!! Entao o que esta fazendo ele no Brasil????? Quantas desculpas e pretextos serao necessarios para justificar o injustificavel?! Digam-me é assim para tudo?!!
Está lá para quê, então?
A pobreza, sempre a magna pobreza..., minha amiga.
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